“A Educação é a base de tudo, e a Cultura a base da Educação”

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quarta-feira, 27 de julho de 2016

- Carta de um blumenauense

Hoje abro meu coração com muito orgulho para apresentar uma dessas centenas de comentários que recebo e compartilhar com todos os cidadãos de Blumenau e região. Em especial ao Wieland Lickfeld , Carlos Braga Mueller, Professora Sueli Petry, Urda A. Klueger, Theodor Darius, Claus Jensen, Djalma Fontanella da Silva filho que assim como milhares de blumenauenses amam esta cidade – “Blumenau cidade que eu amo”.
 
Blumenau 1964
filho pródigo
Querido Prof. Day
Já há algum tempo conheço o seu blog, o qual acompanho, e assisti a algumas das suas entrevistas, que são verdadeiras aulas. Admiro o belo trabalho que o Sr. realiza pela preservação da memória de Blumenau. Tenho uma história um tanto particular e um caso de amor muito especial com esta cidade; para explicar melhor gostaria de apresentar uma breve biografia minha. Atrevo-me a apelar, então, para a sua boa vontade e paciência, para que a leia na íntegra, logo abaixo.

Meu nome é Luiz Henrique da Silva e Sebastião; sou jornalista de profissão, pesquisador e bacharelando em Filosofia pelo Mosteiro de São Bento de São Paulo. O nome no meu e-mail – talvez o Sr. o estranhe – é porque trabalho para a Arquidiocese de São Paulo (Igreja Católica) desde o ano 2007, como jornalista e editor, redator, revisor e diagramador de uma série de obras e também em veículos de comunicação, inclusive no órgão oficial da própria Arquidiocese, o jornal “O São Paulo”. Além disso, presto serviço para editoras nestas mesmas áreas. Sou, resumindo, um profissional de comunicação já há quase três décadas, o que me realiza como profissional e também pessoalmente.
 Blumenau rua Ângelo Dia 1970
Acontece que sou natural de certo município muito especial do Estado de Santa Catarina, chamado Blumenau. Mas (e o ‘mas’ é triste) eu vim para São Paulo ainda criança pequena, com meus três ou quatro anos de idade, trazido por meus pais, que precisaram migrar para esta gigantesca e desumana selva de concreto por questões financeiras: uma situação de urgência. Havia a ideia de retornar um dia, todavia meus pais acabaram permanecendo por aqui toda a vida, até hoje (45 anos depois, 2016). Meu pai Altino da Silva faleceu recentemente, ao final do ano 2012, aos 87 de idade, vítima de um aneurisma abdominal, e ainda no leito de morte dizia que, se ficasse bom, gostaria de voltar a ver Blumenau pelo menos mais uma vez. Porém em nossa vida tivemos fases difíceis, e esse retorno, por muitos anos, não foi possível. Depois, foi sempre adiado, por um motivo ou outro, e, assim, meu querido velhinho morreu sem realizar o sonho antigo.

Bem, o que interessa dizer é que eu mesmo, ainda que tenha sido trazido para cá sem ser consultado, fui desde sempre educado como um legítimo blumenauense. De fato, cresci ouvindo inúmeras histórias de uma cidade como que encantada, maravilhosa, onde tudo eram mais bonito e diferente do lugar onde eu agora vivia: dizia minha mãe Marlene Vieira da Silva, que nesse lugar de sonhos as ruas eram sempre limpas e ladeadas por canteiros de flores; os habitantes eram belos, gentis e civilizados, bem mais que aqui na megalópole; havia um rio bonito e limpo, que refletia o céu e a luz do sol, cortando toda esta beleza, e montes verdes encantadores que a cercavam... Uma cidade ensolarada, de habitações parecidas com casas de bonecas (só que de verdade), com flores nos parapeitos e pinheiros nos quintais, onde pessoas boas, decentes e honestas viviam em paz suas vidas simples e felizes...

Claro que a saudade dos meus velhos fazia com que exagerassem nas descrições e nas histórias da sua terra natal, mas o Sr. pode imaginar o efeito que elas tinham na minha cabecinha de criança e o quanto estimulavam a minha imaginação.

Assim eu cresci. Já adolescente, toda vez que algum filme ou comercial da TV mostrava uma bela cidade ou paisagem, minha mãe sempre exclamava: “Parece Blumenau!”, ou então: “Blumenau é mais bonito!”... Mas aqui em São Paulo era tudo tão diferente... Tão mais triste, árido, cinza, sem vida.
 
Em toda época de Natal, minha mãe me contava longamente, ano após ano, como era encantado o Natal em Blumenau; falava do modo como a cidade era toda enfeitada, com carinho e grande capricho; como as crianças penduravam suas meias na janela e os homens se vestiam de São Nicolau e saíam pelas ruas distribuindo guloseimas... Meu próprio pai, vestido assim e com um saco de balas e doces, entrou em casa de minha mãe, ainda criança (ele era bem mais velho do que ela) e pô-la no colo a perguntar se tinha sido uma boa menina naquele ano. E embora em São Paulo não tivesse nada disso, ela tentava manter essas tradições todas, fazendo-me pendurar a meia na janela (que ela furtivamente, à noite, na véspera de São Nicolau, enchia de doces, para o meu deleite na manhã seguinte), cozinhando aquelas bolachinhas com cobertura colorida e formatos natalinos, decorando galhos no quintal com algodão para imitar neve... Já na época de Páscoa eram as famosas “casquinhas” de ovos, pintadas artesanalmente, que eram carinhosamente guardadas, dos ovos que comíamos o ano inteiro. Tudo à moda blumenauense. 

Sim, apesar de eu ter sido criado em São Paulo, a quarta ou quinta maior metrópole do planeta, fui sempre educado como catarinense, mais especificamente como cidadão blumenauense, à base de cucas, pão caseiro, ovo quente todas as manhãs (gema mole, como a ‘oma’ fazia), repolho azedo no almoço, feijão preto, sagu de sobremesa. E eu falei, até os meus 8 ou 9 anos de idade, naquele sotaque delicioso, meio cantado (‘Vás lá? Então porque viesse aqui?’), o qual, afinal, me esforcei muito para perder na escola, porque  meus coleguinhas riam de mim. Com muito custo troquei o “tu” pelo “você”.

Segundo minha mãe, da sua parte tenho avó alemã e avô português, açoriano, embora ela lamentavelmente não tenha guardado dados históricos familiares mais precisos. Já meu pai era um bom brasileiro; minha mãe dizia que ele tinha sangue “bugre”, embora ele não gostasse de falar sobre isso. Foi jogador de futebol profissional e treinador do Palmeiras Esporte Clube. Quantas e quantas narrativas das suas muitas aventuras e peripécias eu ouvi, muitas delas envolvendo aparições fantasmagóricas noturnas nas pontes da Blumenau de antigamente...
Blumenau 2008
Enfim, peço perdão por tanta divagação. Todo esse preâmbulo foi só para dizer o quanto amei Blumenau a minha vida inteira, ao menos em minha imaginação, ainda que não me lembrasse de praticamente nada dos seus traços, mesmo que mal tenha conhecido suas ruas e seus encantos, dos quais apenas cresci ouvindo falar – e falar sempre tão apaixonadamente. 

O tempo se passou. Vindo de família humilde, eu nunca tive nada fácil, não recebi grandes oportunidades nesta vida; precisei, como se diz, “correr atrás” das coisas. Quando eu era ainda muito jovem (16 para 17 anos), os meus pais, que desde que me lembro sempre brigaram muito, acabaram se separando. Foi um grande sofrimento. As coisas ficaram mais difíceis e também mais tristes para mim. Precisei trabalhar cedo, para ajudar minha mãe, agora só, a pagar as contas em casa. Conforme eu crescia, via o quanto a vida era dura, e por certo ainda mais dura na selva de concreto e vidro onde se respira fumaça e onde, com o passar do tempo, passamos a achar normal viver com medo de assalto, ver crianças abandonadas, aos montes, dormindo imundas debaixo de cada viaduto, e pilhas humanas jogadas pelas calçadas, de gente drogada e desesperançada, ou ainda ter alguém a lhe pedir dinheiro o tempo todo, seja dentro dos ônibus ou pelas ruas.


Não me entenda mal pelas referências negativas que faço à antiga “terra da garoa”. Eu vivi muita coisa boa aqui em São Paulo, esta gigante que me acolheu e me deu muitas oportunidades; mas não posso negar a sua cruel realidade, que eu vi de muito perto. Foi em meio a este cenário áspero que eu amadureci e me estabeleci profissionalmente, casei-me, constituí família... E foi assim, aos poucos, sem perceber, que eu fui me esquecendo daquela terra de sonhos da qual tanto ouvira falar durante toda a minha infância e adolescência, de todas aquelas histórias encantadoras.

Depois de algum tempo, acho que comecei a pensar que a minha tal cidade de origem, idílica e tão encantadora, não existia na vida real, ao menos não da maneira como me havia sido apresentada. Que era tudo fantasia dos meus pais. Não podia existir nada assim, neste nosso país tão complicado. Assim foi até o ano 2013, quando, após um ano de trabalho muito estressante, minha esposa me deu um ultimato: ela precisava viajar no final do ano, e não bastava simplesmente ir à praia (nem eu gosto de praia) ou a algum lugar próximo. Ela queria conhecer, ao menos, algum outro Estado do Brasil. Ela, que gosta de natureza e de apreciar paisagens exuberantes, respirar ar puro, nadar em cachoeiras e coisas do tipo, pesquisava cidades do interior das Minas Gerais para passarmos alguns dias relaxantes. Eu, não sei bem por que, não me encantava com a ideia.
Blumenau 2010
Por fim, de um jeito completamente espontâneo, num belo final de tarde nos encontramos, logo após o trabalho, e resolvemos ir à rodoviária do Tietê, passear entre os estandes das companhias de viagens para procurar ideias de destinos para o nosso passeio, para ver se nos decidíamos. Caminhamos por algum tempo pelos corredores, procurando lugares interessantes para conhecer. E assim, sem planejar, sem combinar nada, sem mesmo pensar nisso, nos deparamos com uma placa singela onde se lia: “Joinville, Jaraguá do Sul, Blumenau...”. Estávamos no lugar “errado”, porque pensávamos em Minas, sentido Norte, e não Sul de São Paulo. Mas aí minha esposa – que viu a placa primeiro – exclamou: “Olha! A sua cidade!”...

Eu olhei aquela placa e o nome “Blumenau” me saltou aos olhos, como se ganhasse vida própria. Num segundo mágico, uma enxurrada de lembranças e emoções me veio à mente, um turbilhão de memórias esquecidas, há muito engavetadas ou varridas para baixo do tapete em algum canto escuro de minha mente. Foi como um despertar! E antes que eu pudesse comentar qualquer coisa, ela, que é sulista também, do Estado do Paraná, disse logo: “E se fôssemos para lá, conhecer a sua terra natal? Seria uma aventura diferente, algo que faríamos por impulso, um jeito de fugir da rotina, como eu quero!”...

De minha parte, mal deixei que ela concluísse a frase. Sem refletir, respondi de bate-pronto, com empolgação: “Isso! Vamos para Blumenau!”... Sentia-me como se voltasse a velha infância, sentia como que uma lufada de ar fresco em meio à rotina estressante do que tinha sido a minha vida nos últimos anos. Assim, sem pensar em mais nada, compramos aquelas passagens já para o dia seguinte, e quando dei pela coisa, estávamos a bordo de um ônibus confortável viajando para a terra encantada dos meus sonhos de infância. Não sabíamos o que esperar nem o que encontraríamos pela frente. Não tínhamos sequer reserva em hotel algum! Queríamos mesmo uma aventura.

Bem, este é o fim da minha história. Um final feliz e um recomeço para mim. Voltei a Blumenau depois de uma vida inteira sentindo-me um “estranho no ninho” numa cidade que eu nunca assumi como minha, e algo muito estranho e totalmente inesperado aconteceu: ao reencontrar as minhas raízes, senti-me totalmente em casa! Senti, no mais profundo do meu ser, que estava no meu lugar, entre a minha gente, a minha grande família, o meu lar! Experimentei uma avassaladora sensação de reencontro, de alguém que estivera perdido por um longo, longo tempo, e finalmente se reencontrava. 

Sou totalmente incapaz de descrever o que este reencontro com Blumenau – com o seu sotaque, suas flores, seu melhor chope e melhor cerveja do mundo, com a Pia Batismal onde fui batizado na Catedral São Paulo Apóstolo, sua gente acolhedora e sempre sorridente e tudo o mais – causou em mim. Foi não apenas a improvável confirmação de todas as histórias fantásticas que eu sempre ouvira, mas a superação de todas elas. Sim, tudo era como eu sempre imaginara desde criança, porém ainda melhor, e muito melhor! Casualmente, esta primeira visita ocorreu na época de Natal, e lá estavam os enfeites, os homens vestidos de São Nicolau, as bolachinhas coloridas da minha infância... Além das ruas floridas e das casas de bonecas que parecem saídas de um sonho ou de um tempo que não volta mais.

Amor à primeira (segunda) vista! Foi sofrido  ter que retornar para São Paulo. Depois dessa primeira experiência inesquecível, voltamos várias vezes; volto sempre que posso. Minha casa e meu ambiente de trabalho estão repletos de souvenires de Blumenau, de canecas na estante e escrivaninha a brasões na parede, além dos livros sobre a cidade. Senti e sinto um orgulho muito puro e autêntico de ser blumenauense.
***************
Finalmente, o motivo desta longa mensagem, que espero não o tenha cansado demais: falando da maneira mais resumida possível, quero dizer que eu tenho planos bem sólidos para lançar um periódico impresso de alta qualidade que farei circular pelas ruas de Blumenau, em forma de revista mensal, que contaria, em partes, a história da cidade e regiões vizinhas, e traria também a cobertura das notícias locais mais importantes e de maior interesse da população. Creio que Blumenau carece de algo assim. Tenho certeza de que este projeto será um grande sucesso e que se sustentará por si próprio muito facilmente, porque teria uma grande quantidade de anunciantes e patrocinadores (tenho vasta experiência na área, sei como fazer e estou bem motivado). 

Como o Sr. já pode imaginar, eu gostaria muito de contar com uma participação sua, com o seu conhecimento inestimável da história, da cultura, dos costumes e tradições desta terra “mágica”. 

Bem, tudo isto foi apenas para me apresentar e apresentar as minhas intenções. Agora que não sou mais um estranho, gostaria de saber se seria possível marcarmos uma entrevista assim que possível.

Desde já agradeço pela atenção e deixo um fraterno abraço,
Aguardo o vosso retorno
Henrique Sebastião
Associação Laical S. Próspero
Tel.s: (11) 3569-1292 / 9-4966-5406 

terça-feira, 19 de julho de 2016

- O senhor Candinho

O jovem e depois idoso Sr. Antônio Cândido
Em história de nosso cotidiano apresentamos  depoimento do senhor Antônio Cândido da Silva, concedido a Rose Mary Soares voltolini em 07 de abril de 1991. Trabalhador da Empresa Industrial Garcia em Blumenau.
Texto enviado pelo Dr. OSCAR EWALD
  
Nascido no dia 31 de maio de 1908, Candinho faleceu de morte súbita, provável aneurisma abdominal de aorta roto, no dia 29 de maio de 1998 prestes a completar 90 anos,. em uma sexta feira, indo fazer compras para festa de aniversário no domingo seguinte! 
Os pais dele eram Nicolau Candido da Silva e Maria Rita Lemos
  
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE REGIONAL DE BLUMENAU.
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES.
EMPRESA INDUSTRIAL GARCIA
DEPOIMENTO DE UM TECELÃO
Rose Mary Soares Voltolini
Curso: História
Disciplina: Pesquisa em História
Ficha Técnica
Entrevistado: Antônio Cândido da Silva.
Entrevistadora: Rose Mary Soares Voltolini.
Local: Balneário Camboriú.
Data: 1991 (7/4).
Título Empresa Industrial Garcia – Depoimento de um Tecelão.
Biografia
Antônio Cândido da Silva, nascido em 31 de maio de 1908 em Blumenau, Santa Catarina. Filho de Nicolau Cândido da Silva e Maria Rita Lemos da Silva. Sua família é composta por dez filhos, entre eles, seis meninos e quatro meninas, sendo ele o segundo mais velho.
Estudou no bairro Garcia, na escola (foto) “(não lembra)” [Com caneta está escrito acima da menção à escola as seguintes palavras legíveis: Prof. Rudolf Hollenweger, ] sendo ele mesmo seu professor, cursou até o 4º ano primário (hoje 4ª série).
Foto da EI. Garcia em 1926
Foto da EIG em 1967
1970
Em 1922 começou a trabalhar na Empresa Industrial Garcia, com seu pai.
Aos vinte e sete anos, casou-se com Rosa Westarb e deste matrimônio tiveram três filhas: Rosa Maria da Silva (falecida aos nove anos), Nair da Silva e Geonilda da Silva.
Família Cândido da Silva reunida no Natal
Residência da família do senhor Candinho na Rua da Glória,100
Em 1966, com cinquenta e seis anos, sua esposa veio a falecer de câncer. Continuou residindo na Rua da Glória até aos sessenta e dois anos de idade quando casou-se pela segunda vez em Rio do Sul, com Tereza (Inês) passando a morar naquela cidade.
No dia 10 de novembro de 1980, seu Antônio e sua esposa, buscaram em Camboriú (cidade), sua filha adotiva, Juliana da Silva.
No ano de 1984, sua residência foi atingida por uma grande enchente, Perdendo praticamente todos os seus pertences, muda-se com a família para Balneário Camboriú, onde reside até hoje .
Relógio que o sr. Candinho ganhou da EIG ao completarr 25 anos de trabalho em 1947
Rose Mary Soares Voltolini – R.M.S.V. – (Entrevistadora).
Antônio Cândido da Silva – A.C.S. – (Entrevistado).
R.M.S.V. – 1991. Estamos na residência do senhor Antônio Cândido da Silva
que fica na rua 916, casa 490, Balneário Camboriú. A entrevista será realizada por Rose Mary Soares Voltolini com aprovação do entrevistado.
Essa entrevista fará parte do Acervo de História Oral do Arquivo Histórico José Ferreira da Silva. Em sua narração, Seu Antônio nos contará como foram seus quarenta e três anos de serviço prestados à Empresa Industrial Garcia.
(Pausa).
R.M.S.V. – Seu Antônio, o senhor poderia nos contar, então, como foram seus anos de serviço na empresa?
A.C.S. – Eu entrei primeiro na Empresa Garcia, meu pai trabalhava, eu entrei junto com ele na sala do pano, significava, na sala de revisão. E depois dali, passei a carregar espula, tratavam naquele tempo de carregador de espula .Trazia espula, espalhava espulas nos teares. Logo passei a ser tecelão.
Nesse tempo que eu estava aprendendo a se tecelão, foi a primeira greve na Empresa Garcia. Meu pai não deixou eu entrar na greve porque ele achava que isso era um... que eu não devia entrar mas aí, o Otto Huber com sua qualidade que ele tinha um alemão, chegou e disse “Halt dein Webstuhl”. Ele disse “para o teu tear” que todo mundo parou, tu também podes ir pra casa. Aí eu parei meu tear com ordem do mestre geral. Fui embora não me metendo. Nem eu, nem meu pai, nos metemos na greve, continuamos. Depois, logo eu passei a trabalhar como contramestre, mas, sozinho primeiro cuidando. Eu trabalhava numa segunda turma, numa sessão onde trabalhava só uma turma. Mas a minha empresa precisava daquela qualidade de artigo, então, a empresa mandou que eu e outro companheiro trabalhássemos de noite, mas nós éramos mesmo, contramestres dos nossos teares, nós tanto trabalhávamos como fazíamos a manutenção. Dali pra frente parou aquilo. Eles acharam que eu era capaz de consertar tear.
Alguns artigos que a Empresa Garcia produzia
Comecei a trabalhar na mesma sessão, na mesma sala e na mesma segunda turma, como contramestre. Saí dali, passei para a sala 13, que é a sala mais antiga. Quando eu, aliás, eu devia contar como é que era, primeiramente, a Empresa Garcia, conforme você perguntou. É uma novidade a Empresa Garcia não tinha telhado. O telhado da Empresa Garcia era de vidro. Vidro fundido com arame, com ferro, isso aí da muito calor no verão, era um calor insuportável. Ela foi crescendo, a Empresa Garcia foi crescendo, mas eu já era contramestre na Empresa Garcia. Primeiro aumentou a sala 14 de felpudo. Passou a sala 14, se formou a sala 15 com tear de felpudo e alguns teares de chacate. Quer dizer:felpudo e chacate em alto relevo, isto é, atoalhado, roupa de cama, todas essas coisas, diversos, toalha de mesa...Bom, enfim, depois dali começou a sala 16, só felpudo. Foi a carreira, estou falando da carreira, como a Empresa Garcia foi crescendo. Depois disso a Empresa Garcia fez a outra sessão que era a sala de automática, tear automático. Assim a empresa foi crescendo que era uma maravilha, crescendo, crescendo... A sala de automática, ela lotou porque onde eu trabalhava, aliás, na primeira sala de felpudo chamava-se tinha o nº14 e essa sala de automática também passou a ser 14 não, levou sala 14ª e até ali eu conheci a Empresa Garcia.
Agora vamos a outro assunto, como é que essa Empresa Garcia, um caso que eu gostaria de narrar, porque a Empresa Garcia não merecia sofrer, digo, o nome da Empresa Garcia que era um nome de tradição, tanto no país como mundial ou internacional. Ela não merecia sofrer o que sofreu, mas como diz o ditado “não faça mal a seu vizinho que seu mal tá no caminho”, eles tiraram a Empresa Garcia, não sei por intermédio não sei de quem trouxeram um tal de, tiraram o gerente que era o João Medeiros e botaram o Ernesto Stodieck, então tirou o Otto Huber, a mão direita da Empresa Garcia, aquele grande austríaco. Tiraram ele, no dia que deram sentença que o Otto Huber saiu ele caiu na cadeira dele. Deu um choque no coração dele, decerto foi grande, porque ele estimava aquilo e foi levado. Quem levou ele pra casa foi o cunhado, Rodolfo Wuensch contando a causa da Empresa Garcia. O Otto Huber fez um ranchinho lá numa terra de um tal de Johann Heinrich Grevsmuhl que tinha uma atafona, tinha engenho de serra, e tudo ali perto de uma Companhia.
Já existia o Zadrosny e o tal de Dr. Hess, junto com o Otto Huber. O Otto Huber levou o Rodolfo Wuensch que era um senhor de uma boa pessoa pra cuidar, ele conhecia a manutenção de tecelagem e ele fez a pequena tecelagem e começaram. Nós, cá na Empresa Garcia, rindo daquela pequena tecelagem, eu não, eu nunca gostei porque eu gostava do tal Otto Huber e sempre até eu gostava justamente quando fez 50, 25 anos eu fui lá visitar. Fui lá ver como estava grande aquilo. Foi se formando a Artex.  A Artex foi crescendo e a empresa foi parando e até que um dia, como diz o ditado, mas é bem ao contrário essa história que vou contar. Eu dizia sempre assim, diz o ditado “que a cobra come o sapo”, mas ali foi bem ao contrário, “o sapo comeu a cobra” porque agora, aquela mini tecelagem que tinha lá foi crescendo e comeu aquela que comprou mais tarde. Comprou aquela poderosa Empresa Garcia, grande firma de nome que era internacional. Isso eu não posso compreender como foi aquilo. O povo, mas eu já não trabalhava mais, o povo ficou revoltado. Choro e ranger de dente, de raiva, tudo aconteceu na Empresa Garcia. Agora eu também vou contar, na Empresa Garcia, você está perguntando coisas de mim?
R.M.S.V. – Sim, sim.
A.C.S. – Eu trabalhei muitos anos na Empresa Garcia, dentro desses quarenta e três anos eu também vi aquelas artes, aquelas coisas bonitas, aquele felpudo, os desenhos, eu quis caprichar para subir, ficar mais alto pra aprender por correspondência, a teoria de tecelagem de São Paulo, mas por correspondência depois em janeiro, não tenho mais na memória qual foi o ano que fui examinado, nós tínhamos quatro dias para fazer os exames da nossa lição feita por correspondência. Peguei um certificado, não foi diploma, me deram um certificado como eu tinha estudado e que eu era capaz de fazer em todo tecido de tecelagem, mas não cresci na Empresa Garcia. Fiquei ali parado e comecei. Eu dizia pra eles: “eu sei, eu quero”, mandava, falava, mas isso não entrava no ouvido lá da direção da Empresa Garcia, não sei, decerto eles estavam muito ocupados, talvez não iam com a minha cara, talvez não sei o que.
R.M.S.V. - A sua última função seria a de contramestre até ali?
A.C.S. – Até ali eu era contramestre, já estava como supervisor porque tinha na minha sessão dois ajudantes e um contramestre e eu era mais ou menos como supervisor.
R.M.S.V. - Sim.
A.C.S. – Sempre fui um que ganhou quase sempre um pouquinho mais do que os outros contramestres. Pouca coisa, mas sempre ganhava mais porque a minha produção era sempre acima de 90%, agora como acontecia isso quase impossível, como acontecia isso eu não sei. EU queria aumentar, aprendi a fazer desenho e fazia desenho de felpudo de alto relevo e também felpudo de flor, de maneira que eu fiz um desenho pra fora. O primeiro desenho que eu fiz na minha vida, foi um desenho para aquelas toalhinhas para botar atrás do banco, do acento, do avião que era da “Varig”, então tinha que escrever um aviãozinho e no aviãozinho, por detrás, escrever “Varig” até eu fiquei admirado de mim mesmo, que eu fiz uma coisa com muita perfeição, muito bonitinho.
Dali comecei a fazer. A empresa soube que eu estava fazendo isso, me chamou atenção uma vez, me chamou a segunda vez, me chamou a terceira vez, na terceira vez me disseram: “você tem que assinar/ isso aqui, senão nós vamos processar você”. Eu assinei um atestado que não deveria mais fazer desenho para fora porque eu estava fazendo concorrência contra a firma, mas coisa que eu nunca precisaria copiar, nunca precisei copiar porque eu criava mesmo sozinho, eu tinha essa capacidade porque eu aprendi, eu também tinha a capacidade de fazer, de criar outra coisa, não precisava copiar aquilo que a empresa estava fazendo.
R.M.S.V. – Sim, e sua intenção também não era de concorrência?
A.C.S. – Não era concorrência, a minha intenção era de subir um pouco mais alto. Eu merecia, eu fui um operário de quarenta e três anos de serviço, não é brincadeira. Depois saí de lá, somente com o meu salariozinho, três salários.
Vamos dizer que era cento e cinquenta e seis mil cruzeiros que eu ganhava.
Três salários e um pouco, naquele tempo um salário era cinquenta, era cinquenta cruzeiros por salário. Eu ganhei três salários dava cinquenta e seis, dava cento e cinquenta e daí, de maneira que passei o tempo todo ali, trabalhei parece mais três anos, pedi por favor pra eles, eu via mesmo que não me chamavam num ponto mais alto, eu pedi pra eles pagar pra mim um pouco mais, pra eu ganhar mais quando me aposentasse, tirasse mais do meu salário, pagasse, não precisaria eles pagarem. Tirasse do INPS, pra poder, quando me aposentasse, ganhar mais. Não no último pedido que eu fui fazer pra eles, assim: “escuta o Rolf, eu venho aqui hoje fazer um pedido para o senhor”. “O que é Antônio, o que tu queres pedir que eu faço”. Eu disse: “ Eu queria pedir pra me aposentar e continuar o serviço como a lei permite”. “Antônio, não dá porque os teus subordinados estão de boca aberta esperando a tua vaga”. Eu morri, aí acabou.
R.M.S.V. – Seu Antônio, como era, na sua época, o regulamento com os funcionários dentro da tecelagem?
A.C.S. – Assim conforme eu já disse para você, como tá gravado, a Empresa Garcia era uma empresa sem telhado, era de vidro, mas não de dizer atirem uma pedra em cima e quebra. O vidro era com uma peneira, de arame por dentro, isso dava muito calor no tempo de verão. No inverno era frio e no verão era quente. Mas agora sobre o regulamento, era severo. Era uma coisa que tinha ordem, mas nós, como tecelão, não tínhamos hora de serviço. Nós tínhamos hora de entrada, mas menos a hora de serviço. Nós trabalhávamos, naquele tempo, devia ser em 30 antes das leis, nós trabalhávamos quanto queríamos, porque nós ganhávamos por metro e não por batida. Naquele tempo não existia esse relógio de marcar ponto. Hoje se ganha só por batida, por quantidade de batida. Faz por dia, por mês, soma, o empregador faz a média, tantas batidas, o operário ganha tanto. Naquele tempo não, era por metro. Quanto mais nós produzíamos, mais nós ganhávamos. Não havia primeira e segunda turma, não tinha essa ideia, o tear era nosso até nossa vontade. Às vezes trabalhava até às nove horas da noite, às vezes até às dez horas, até às oito era assim. Quando a fábrica parava e não tinha mais barulho, o guardião, que tinha a portaria ali ao lado, ia lá dentro e olhava aquilo tudo, lá dentro estava tudo fechado, tudo parado, apagava as luzes, parava os motores e saía. Agora sobre o regulamento lá dentro, da ordem que nós tínhamos, era uma ordem severa, não uma ordem de escravo não, era uma ordem para não deixar a regalia, a vontade. Para ir no banheiro fumar, nós tínhamos que deixar o tear trabalhando, e na volta fazia que ia no banheiro, enquanto isso ia fumando, em viagem acendia o cigarro, voltava quando chegava na porta outra vez quebrava, botava o cigarro fora e entrava na fábrica trabalhando. Uma vez até eu tinha deixado o meu tear trabalhando e saí, fui ligeiro, o Schrader naquele tempo o Schrader era o gerente, chegou e disse “escuta aqui, eu já passei diversas vezes por aqui e o seu tear está trabalhando sem dono, digo, não senhor, é a primeira vez”. Ele chegou a dizer até pra mim: “olha, se acontecer mais uma vez, tu sabes, por onde tu entraste aqui tu vai sair também”. Ele quis dizer com isso que ele me botava na rua mas eu era garoto naquele tempo, mas isso me serviu para uma alta lição porque, embora se eu quisesse ir no banheiro fumar uma ou duas vezes por dia, porque o fumo faz mal, eu achei que ele tinha razão. Eu nem contei para o meu pai porque meu pai ia brigar comigo, lógico. O regulamento lá dentro era assim: bem em ordem e mulher, naquele tempo, não trabalhava no tear era só homem, depois começou a entrar mulher também. Começaram a fazer a segunda turma. Não que a Empresa Garcia, toda vida só teve primeira e segunda turma na parte de tecelagem, agora na fiação, que é da mesma Empresa Garcia. Que era ligado a tecelagem. A fiação tinha três turmas para poder dar conta da tecelagem porque a Empresa Garcia nunca comprou fio fora, comprou só algodão em fardo em São Paulo. Nós sempre víamos quando vinham caminhões e caminhões, fila de caminhões, sempre de fardos de algodão que eles compravam. A Empresa Garcia nos primeiros tempos, foi uma empresa bem calçada uma coisa que eu deveria já ter dito no começo. A Empresa Garcia foi formada pela companhia, um sócio da empresa, o primeiro que fez a Empresa Garcia foi a família Hauer junto com o Probst. Isto era por ali onde hoje é a Artex, mais ou menos por ali. Depois passou pra frente, o lugar era maior, lá onde estava, o lugar era pequeno. Ali onde está a empresa hoje não é mais a empresa é a Artex. Ali a empresa foi crescendo, se formou naquele ponto. A empresa passou só para o Probst e dos Probst passou para a família Hauer de Curitiba, a família Hauer os últimos sócios, o mais forte. Com as pequenas lembranças que eu tenho o último sócio mais forte, vamos dizer, os donos da Empresa Garcia, o dono mesmo, com todo o poder era a família Hauer de Curitiba. Tinha o Alex Hauer, aquele trabalhou muito tempo, até fazia pagamento para os operários. Esse tal de Alex Hauer e tinha outro Hauer que agora no momento eu me esqueci o nome, também foi gerente, depois esse Hauer saiu e entrou o João Medeiros, João Medeiros filho do velho João Medeiros, chamava-se João também e tinha o filho. Foi crescendo de maneira que quando eu deixei a Empresa Garcia, quando eu saí da Empresa Garcia, ela começou assim com pouca gente, quando eu saí estava com três mil empregados. Outra vez falando da Artex, quando eu deixei a Empresa Garcia, a Artex estava mais ou menos com duzentos empregados e a Empresa Garcia estava com três mil empregados e aquela pequena fábrica, de duzentos ou trezentos empregados comprou aquela que tinha três mil empregados.
R.M.S.V. – O senhor falou antes que mulher não trabalhava com tear, onde elas trabalhavam? 
A mulher e a força do trabalho na EIG
A.C.S. – Elas tinham serviço separado. Elas trabalhavam na espula, na meadeira, mas mulher era pra fiação. O serviço da fiação justamente um serviço que dizia propriamente para mulher. Ainda hoje, acredito que a fiação é mais para mulher, é um serviço mais leve é um serviço que não precisa carregar rolo, para tirar as espulas, tem os contramestres que faziam isso. Elas só cuidam e limpam, é um serviço muito fácil. A Empresa Garcia separou tecelagem para homem, fiação para mulher. A fiação na Empresa Garcia como está hoje, ainda é uma grande fiação, é uma fiação que eu não sei se tem aqui no Estado como aquela. Pode ser que em Brusque tenha, mas eu não sei, porque a fiação da Empresa Garcia é muito grande.
R.M.S.V. – O senhor lembra como era feito o tingimento do fio e do tecido?
A.C.S. – Lembro sim. Tudo isso era feito lá. Tinha a tinturaria separada, primeiro foi, tinto, era tingido o tecido dentro de tinas, levavam lá na água corrente para passar água. Levavam com carrinho, com vagãozinho, levavam e traziam. Trabalhavam dessa maneira, depois no fim, trabalhavam com essas coisas automáticas. Tudo automático, eles primeiro faziam a roca, antigamente faziam o fio, alvejavam em meadas, nos últimos tempos estavam alvejando em roca. Ali ia para o secador, do secador ia para o tear o fio já alvejado, e também já faziam cru. Eles alvejavam quando era um pano branco, só branco.
Vamos dizer, pra roupa de cama faziam cru e alvejavam. Na tinturaria moderna que eles tinham, não sei se existe outra igual aquela, porque a Empresa Garcia podia naquele tempo. Se outra tecelagem foi formada em Blumenau, foi copiada da Empresa Garcia. Porque a empresa foi a maior tecelagem que eu conheci até hoje. Até fui diretor de outra firma lá em Rio do Sul. Eu trabalhei, entre tudo, sessenta e três anos em tecelagem, de maneira que eu estou dentro do quadro de tecelagem, ninguém precisa me ensinar nada, eu conheço bem essa arte. Ainda hoje em dia, se precisar trabalhar, apenas pela visão, eu era capaz de dirigir qualquer firma. Então, como nós íamos falando da tinturaria, a tinturaria tanto alvejava como também tingia o pano, a cor que quisesse. Todas as cores para vender em peça. Logo já botaram na mesma tinturaria, no outro lado, a estamparia, também pertencia ao ramo da tinturaria.
Isso já foi quase no fim da vida da Empresa Garcia. Já estava sentindo meio fraca, mas ainda deu para fazer essa estamparia, isso eu tenho certeza porque pouco conheci a estamparia. Logo quando eu saí, a Artex comprou, quando eles me disseram que a Artex tinha comprado a Empresa Garcia eu não quis acreditar nem por nada. Não quis acreditar porque era impossível e foi comprado mesmo. Eu mesmo de fora da firma, saí um pouco retraído, um pouco aborrecido dela mas ainda fiquei com muito choque, com pena, de uma grande firma com tanto sacrifício dos operários, dos mandatários que mandavam lá dentro e depois acabasse assim, em nada, mas nesse tempo foi a falência. Vamos dizer, eu acredito que foi a falência. O gerente era o Jorge Buechler (falecido em 2016), naquele tempo era o Jorge Buechler que mandava naquilo lá, sabe?
Eu quero alterar uma coisa aí. Que, se saiu um grande homem da Empresa Garcia, assim como eu ele está vivo e são, pode provar. Foi o Alfredo Iten (falecido em  26/10/2011 aos 92 anos). Se o Alfredo Iten estivesse dentro da Empresa Garcia, não teria acontecido aquilo. Assim como eu posso provar que o Alfredo Iten chegou lá na Cremer. Até onde ele ajudou uma tecelagemzinha lá em Rio do Sul por causa disso eu digo, uma grande besteira, a empresa tropeçou na pedra, foi ter tirado o Alfredo Iten lá de dentro.
R.M.S.V. – Seu Antônio, o senhor teria mais alguma coisa pra nos contar?
A.C.S. – Rose, teria muita coisa sabe quarenta e três anos de trabalho, isso é muita coisa mas com o tempo a gente vai esquecendo e conta detalhe por detalhe, alegria, sabe como é operário pouco tem dentro da firma e começa a fazer fofoca, e contar as mágoas, isso quase ninguém gosta de ouvir. Eu acho que fico muito obrigado pra você que veio de Blumenau pra cá e com muito prazer escolhesse eu como um de tua confiança, que trabalhou na Empresa Garcia quarenta e três anos. E pode acreditar dona Rose que eu não. (Virada da fita). Talvez esqueci de dizer algumas coisas muito úteis, mas infelizmente não posso fazer nada. Mas o iniciado eu contei, a coisa mais interessante da Empresa Garcia, e do Estado, que ela é hoje em dia, eu entrei lá dentro que era coberta com telha de vidro. Não faz tua casa com telha de vidro que os outros atiram pedra em cima e quebram, mas aquela não quebrava não, era coisa boa, um vidro grosso ainda, feito com uma peneira de arame por dentro mas só que era ruim, era claro, muito claro para trabalhar, no sentido de tecelagem era uma maravilha, porque gastava pouca luz, porque era como estar na rua, a mesma coisa é uma casa com telhado, fica escuro, então aquele telhado de antigamente, foi uma coisa muito boa mas não precisava de energia a gente enxergava de longe porque era tudo claro, a sala tinha mais de cem metros de distância. Enxergava um companheiro, já sabia quem era.
 
Lançadeira e espula que produzia a toalha
Assim era a Empresa Garcia, aquilo era uma maravilha, nós tínhamos nos primeiros tempos, no tempo do Otto Huber, nós tínhamos quase que mensalmente uma churrascada para os operários, de graça, nós tínhamos lá um lugar chamado “Hirschloch”, isto em brasileiro chama-se “O Buraco do Veado” justamente lá tinha uma água onde os veados caíam lá dentro, os caçadores matavam. E depois dali começaram a diminuir e a fazer três ou quatro vezes por ano no mesmo restaurante que a empresa tinha. A empresa tinha um restaurante para os empregados da empresa almoçar ao meio dia, quando vinham de longe e até para os solteiros que não moravam ali também podiam ficar no hotel. Logo fizeram um hotel e um dormitório muito grande.
Justamente quem cuidava do dormitório da Empresa Garcia, primeiro, que eu posso dizer, foi a minha senhora, a Rosa, que hoje em dia é falecida. Tinha ali uma porção de empregados que dormiam naquele dormitório e comiam no restaurante. O restaurante era tocado por um irmão meu, chamava-se Pedro Cândido da Silva e sua esposa Aquilina (Bohn) da Silva, de maneira que nós éramos muito conhecidos na Empresa Garcia. Ainda hoje, felizmente, quando vou lá eles me tratam pelo meu nome, é Antônio Cândido da Silva mas como meu pai era pequeninho eles chamavam meu pai de Candinho, então hoje quando chego lá, eles me chamam de “Candinho”. O meu maior prazer quando chego lá é ver aquela gente antiga, sabe por que? Eu gosto muito daquela gente de lá, gosto porque eles me tem como parente deles. Essa lembrança traz da minha qualidade, não é que eu vou me prosear mas eu acho da minha criação, da educação que meu pai deixou para mim. É assim que eu espero que a mocidade de hoje em dia cresça com essa ideia como eu tenho até hoje graças a Deus. Nunca tive queixa, nem processo, nem fiz queixa e nem processei, nem fui repreendido por polícia de qualidade nenhuma graças a Deus essa é minha atitude que eu digo pra ti, pra senhora, perdão, que eu nunca tive questão eu era meio safado nos bailes, eu gostava de brincar, mas sabe, ao invés de ir para casa cedo, eu chegava tarde, mas sempre obedeci meus pais. E daí na Empresa Garcia. Eles também usavam pelo Natal fazer um Papai Noel e faziam o Papai Noel mesmo.
Eu fui ver um Papai Noel enfeitado como usa a tradição europeia foi na Empresa Garcia. Um Papai Noel bem feito, vestido de vermelho e branco, barba bem grande, foi lá Empresa Garcia o primeiro Papai Noel, isso continuou anos, mas digo, no tempo do senhor João Medeiros ou no tempo do Mendes, naquele tempo. Mas depois que entrou o senhor Stodieck acabou-se tudo, foi tudo pro monte, empilharam e depois a Artex comprou tudo. Eu acho, dona Rose, que se eu tivesse muito tempo eu tinha pra contar um mês inteiro a história da Empresa Garcia.
R.M.S.V. – Seu Antonio eu agradeço ao senhor pelo seu tempo e a sua dedicação à nossa entrevista.
A.C.S. – Se precisar outra vez pra falar do nome da Empresa Garcia, que o nome da Empresa Garcia, com toda a ingratidão que eu recebi dos últimos dirigentes mandatários, eu ainda tenho a Empresa Garcia dentro do coração.
Parece que a Empresa Garcia existe e não é a Artex, mas felizmente está em boas mãos.
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Arquivo de Adalberto Day e  da família Dr. OSCAR EWALD/Oftalmologia Clínica e Cirúrgica/CRM/SC 12330 RQE 8036/  Especialista em Oftalmologia pelo MEC e CBO - Fellowship em Glaucoma pela USP;   Membro da Sociedade Brasileira de Glaucoma.
 www.oftalmocenterblumenau.com.br

terça-feira, 5 de julho de 2016

- O primeiro “prefeito” de Blumenau

Em histórias de nosso cotidiano: personagem importante na história de Blumenau.
José Henrique Flores Filho.
Participação do Jornalista/escritor e colunista o renomado Carlos Braga Mueller. 
Em seu texto, Braga relata sobre o primeiro (considerado) prefeito de Blumenau - José Henrique Flores Filho - morou no bairro Garcia. Morto prematuramente em acidente com sua Aranha, na Estrada Geral do Garcia - atual Rua Amazonas sem deixar descendentes.
Por Carlos Braga Mueller
JOSÉ  HENRIQUE  FLORES  FILHO 
– Você sabe quem foi  ?
Talvez por ter um nome extenso – José Henrique Flores Filho - ele foi abreviado quando lhe homenagearam com o nome de uma rua em Blumenau. Nem foi uma rua; apenas uma travessa, modesta, estreita, com uma curva exagerada e um estreitamento inexplicável.  A Travessa Flores Filho fica entre a Rua 15 de Novembro e a Rua Getúlio Vargas. Tem início na Quinze, entre o Banco do Brasil (antiga Agência Besc) e a Relojoaria Universal, e não tem mais que 50 metros.


Flores Filho foi o primeiro administrador do município de Blumenau, de 1883 até o final de 1887, logo após o Dr. Blumenau ter deixado a administração da sua antiga Colônia. Naqueles tempos quem comandava os destinos do município era o Presidente da Câmara de Vereadores e Flores Filho presidiu a primeira legislatura blumenauense; por consequência administrou Blumenau durante 4 anos.
O cargo de Intendente, depois Superintendente (equivalente ao atual Prefeito) só viria com a Proclamação da República, em 1899.
Embora o município de Blumenau tivesse sido criado em 4 de fevereiro de 1880, a grande enchente daquele ano impediu que se constituísse logo  um governo para substituir Hermann Blumenau. Somente em 1º de julho de 1882 realizaram-se as eleições para a escolha dos sete vereadores que deveriam compor a Câmara. Mas apenas 4 foram eleitos então. Nova eleição foi realizada para a escolha de mais três, oficializando o poder legislativo blumenauense.
Flores Filho, natural da cidade de Itajaí, a cuja Comarca Blumenau pertencia, era filho do Tenente Coronel José Henrique Flores e de sua esposa Maria Clara da Silveira Flores, que possuíam extensas áreas de terras na região da foz do Rio Itajaí-Açú.
Morava na estrada  para o Garcia, atual Rua Amazonas.
Foi num deslocamento entre sua casa e a Coletoria das Rendas Provinciais, que assumiu após a vereança, que teve uma morte trágica. No dia 18 de março de 1891 a “aranha” (charrete) que conduzia acidentou-se, causando-lhe a morte.
Antiga prefeitura de Blumenau - Atual F.Cultural
ADMINISTRAÇÃO
Conforme relato de historiadores, Flores Filho fez uma administração sensata, que foi marcada por importantes acontecimentos, impulsionando a vida social e econômica de Blumenau.
Em 1883 foi decretado o primeiro Código de Posturas do município.
Durante seu governo foi criado, em 4 de setembro de 1886, o  Distrito de Indaial.
Foi instalada em Blumenau a Comissão de Terras e Colonização.
O Conde d’Eu, marido da princesa imperial Dona Isabel, visitou a Vila, sendo recebido com grandes festividades.
Foi inaugurada a linha telefônica entre Blumenau e Itajaí.
Em 20 de agosto de 1886 foi criada a Comarca de Blumenau.
E foi na sua gestão que, em 15 de agosto de 1884, Hermann Bruno Otto Blumenau despediu-se dos blumenauenses e partiu para a Alemanha, aonde viria a falecer em 1899.
Fonte: Os Administradores de Blumenau (Blumenau em Cadernos Tomo II, 1959)
Para saber mais sobre Flores,  acesse: http://goo.gl/OZOJkc 

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