Em História de nosso cotidiano, apresentamos hoje, uma entrevista concedida pelo senhor Luiz Felsky (o Milico) no jornal Tribuna do Vale do Itajaí em 1991. Enviado por Arlete Felsky Filander.
12 MAIO/91 TRIBUNA DO VALE DO ITAJAÍ
Isso é amor antigo
Uma das pessoas mais queridas do bairro Garcia, carinhosamente apelidado de Milico pelos amigos, Luiz Felsky é entrevistado do mês da Tribuna. Nascido em Brusque, em 20 de julho de 1914, nove filhos e 16 netos, ele nos falou de sua vinda a Blumenau, seu primeiro emprego como alfaiate, da profissão, dos velhos tempos, de política, das festas e do bairro. E faz um pedido singelo: que os moradores do Garcia, principalmente os jovens, se esforcem mais na preservação do bairro. “O que eles fazem agora estarão fazendo para seus filhos; o que eu fiz, estou colhendo agora através de meus filhos”.
Tribuna: O senhor saiu de Brusque para vir a Blumenau em que ano?
Milico: Em 1930. Estudei dois anos no Colégio Santo Antônio e resolvi então aprender a profissão de alfaiate e me mudei para o bairro Garcia para trabalhar na Alfaiataria “Gauche” cujo proprietário era o Senhor Arnaldo Gauche. Trabalhei seis anos aprendendo a profissão. Logo em seguida houve uma crise, onde fui trabalhar na Empresa Garcia, naquele tempo não existia esse negócio de oito horas, fundo de garantia, 13º, férias, INPS, não existia nada, era só trabalhar. Com a melhora da situação econômica fui trabalhar novamente na Alfaiataria “Gauche”. Saí dela depois de sete anos, fui para São Paulo fazer um curso de aperfeiçoamento em corte e costura, em seguida para o Rio de Janeiro e oeste de Santa Catarina e depois para a rua da Glória, onde estou até hoje.
Tribuna: Por que o senhor tem o apelido de Milico?
Milico: Quando começou a guerra, um tenente ou sub-tenente amigo meu, naquele tempo todo mundo era amigo, todos se conheciam, me chamou no quartel e pediu para que eu trabalhasse pra eles. Mal eu tinha começado a alfaiataria na Rua da Glória, mesmo assim aceitei.
Quando a turma vinha fazer roupa comigo e dizia que não podia, pois estava trabalhando para o quartel, fazendo roupa para “milico”. Onde levo este apelido até hoje. Mais tarde, numa partida de bocha, jogando com a turma, um amigo disse: “O milico, racha o milico”, que era o bolim. Eu, com sorte por ser um bolim velho, acertei e rachei e aí fiquei com apelido de Racha Milico, sendo agora só Milico, como sou conhecido.
Bodas de Ouro Sr. Luiz e Dona Erica (Dona Muchi) com Arlete ao centro
Tribuna: Com quantos anos o senhor casou?
Milico: Casei com 33 anos, com Erica Dietrich, filha aqui do bairro.
Tribuna: O senhor é o morador mais velho do Garcia?
Milico: Eu vou completar 77 anos em julho. Não sou bem um dos mais velhos do bairro Garcia e sim do bairro Glória. Naquele tempo existiam de 10 a 15 moradores, lembro de quase todos: família Schwarz, Loes, Serafim de Oliveira, Rude Pabst, João Michifelds e outros. Esses já morreram.
Tribuna: Isso significa que o senhor é um dos últimos daquela geração?
Milico: Da geração velha sou eu. Dessas pessoas que já morreram eu lembro do velho Deca, que junto comigo e os demais companheiros fomos os fundadores da igreja e da escola. Inclusive nós temos o diploma de fundadores.
Tribuna: O senhor sempre gostou de política e simpatizou com Aldo Pereira de Andrade e Renato Vianna...
Milico: Política eu entendia mais ou menos. A gente conhecia todo mundo, inclusive o pessoal da cidade. Depois, um alfaiate naquele tempo era como é hoje um médico: era convidado pela sociedade. Fui convidado para muitos bailes no Olímpico, Tabajara, Carlos Gomes. Eu conhecia toda Blumenau. Na casa Flamingo, Casa Mayer a rua era toda de pantano e tinha uma calçada de madeira, por baixo passava o rio, vapor Blumenau frete para Itajaí.
Tribuna: Para quais políticos o senhor fez terno em Blumenau?
Milico: Eu fiz ternos para alguns políticos que eu lembro: senhor Curt Zadrozny, Aldo Pereira, Hercílio Deeke, Roberto Mata, Elias Adaine, Abel Ávila dos Santos.
Tribuna: O que o senhor acha da política do bairro ou de Blumenau?
Milico: Hoje já não estou mais na idade, não leio mais tanto.
Tribuna: Alguma coisa interessante que ocorreu em sua vida? Uma vez o senhor trocou uma bicicleta por um engradado de cerveja...
Milico: Foi numa festa de aniversário em Gaspar Alto. Foi uma brincadeira, naquele dia eu não tinha dinheiro, então empatei a minha bicicleta, só que o homem não levou a sério e no outro dia devolveu a bicicleta.
Tribuna: O que o senhor acha de bom, de ruim na Rua da Glória?
Milico: A Rua da Glória não está ruim, existe muita gente de respeito. Não é qualquer bairro que possui dois centros sociais, várias creches, muitas casas comerciais e uma escola que atende dois mil alunos.
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Texto de Arlete Felsky Filander escrito no dia do falecimento de seu pai Luiz, dia 04/abril/1998.
MEU PAI - esse cara é incrível!
Falar, cantar, dialogar, pensar ou escrever sobre ele é simplesmente pouco demais.
Ele é muito, mas muito incrível mesmo!
Se sinto orgulho dele? Muito mais que isso. Ele é a criatura humana mais importante na minha vida.
Se me deu exemplos de vida? Foi só o que ele fez em cada minuto em que tive a feliz oportunidade e a felicidade de poder conviver com ele, por tanto tempo e por tão pouco tempo ao mesmo tempo.
Eternidade? Sim, ele é eterno para mim.
Ilimitado no seu amor que me faz, e que agora se perpetua dentro de mim pela vida afora...
Oxalá cada um de vocês tivessem o privilégio de ter um PAI como o meu PAI. Ele é a mais humana de todas as criaturas que já encontrei, com todas as qualidades e alguns dos defeitos que somente os verdadeiramente humanos podem ter. E sempre, sempre e sempre, transpunha qualquer dificuldade ou vitória, com um sorriso em seus lábios e o seu jeito tão, mas tão especial de dizer: Muito obrigado!
Ele sempre sabia agradecer. JUSTIÇA, INTEGRIDADE e HONESTIDADE era a sua bandeira predileta.
abnegação permanente por todos nós seus filhos essa é ilimitada.
Nas minhas duas mãos, segurei a tua mão direita e só pude dizer:
TE AMAMOS MUITO. PARA SEMPRE. MUITO OBRIGADO.
Arquivo Arlete Felski Filander e Adalberto Day
Caro Adalberto, assim é a história, escrita não apenas por pessoas que se destacaram na política e nos grandes empreendimentos, mas também por aquelas que dedicaram sua vida ao sucesso das empresas nas quais trabalharam, ao bairro no qual moraram e, não menos importante, à sua querida família. Foi um prazer conhecer o Sr. Milico hoje, graças à contribuição da amiga Arlete, que já foi minha vizinha no Garcia, e a quem envio um grande abraço. Tive a satisfação de conhecer o Sr. Gauche, o alfaiate citado no texto, mas não foi sua habilidade com a tesoura que fez com que o procurasse. Ele também era músico e luthier. Seu hobby era fabricar e restaurar violinos. Há muitos anos, pouco antes de falecer, restaurou um violão Del Vecchio que pertenceu ao meu bisavô Johann Jelouschek, falecido há 50 anos. Quando, pouco depois, voltei à sua casa para adquirir um violino fabricado por ele, feliz por ele ter conhecido meu bisavô e ter consigo partituras que este escreveu para ele, sua esposa, ao me receber, chorou. Ele fora chamado desta vida para a eternidade. Muito obrigado a você e à Arlete pela alegre lembrança do Sr. Gauche que hoje me proporcionaram. Grande abraço!
ResponderExcluirEle o Senhor Milico chegou a confeccionar roupas para mim.
ResponderExcluirUm forte abraço
Olímpio Moritz e Família
Beleza Adalberto,
ResponderExcluirQue história singela.
Parabéns pela publicação.
Antunes Severo
55 48 9919 1337
www.carosouvintes.org.br
easevero@carosouvintes.org.br
Adalberto:
ResponderExcluirNa década de 1960 eu era uma aluninha na Escola São José, e pegava ônibus para ir para casa no ponto final do mesmo (motoristas Ivo, Carlinhos, seu Waldemar...), que era diante do Milico Alfaiate. Apesar de ter passado muitas horas daqueles tempos ali diante da casa dele, penso que nunca o vi, que só o conheci hoje, pelas fotografias.
Lembro muito é da Arlete - creio que em 1961 ou 1962, ela, belissimamente vestida de cigarra, com uma roupa como nunca víramos, segurando nas mãos um violino envernizado, encenou a peça "A cigarra e as formigas", no palco do pátio da Escola São José. Era a cigarra mais bonita que poderia haver, tanto que convenceu as formigas da sua utilidade no mundo! Quem fomentava toda a atividade de teatro no colégio, nessta época, era a Irmã Maria Josélia, que muitos anos mais tarde soube que fora fazer Artes Cênicas numa grande universidade de São Paulo.
Parabéns pela matéria!
Urda.
Lembro das vezes que fui levado por minha mão ao "atelier" do alfaiate Milico da Rua da Glória, para tirar medidas para as calças que ele confeccionava com inigualável qualidade. Fez o meu terno de casamento. Seu Milico e Dona Muche, casal que marcou marcou na vida de muitos blumenauenses do Bairro Glória. Muito bom relembrar esses fatos. Abraços a todos os seus filhos, amigos de nossa infância e adolescencia.
ResponderExcluirJosé Carlos de Oliveira.
Amigo Adalberto
ResponderExcluirEu nasci em 1948 e logo aos sete anos de vida, comecei a freguentar a escola São José,a minha cas ficava bem ao lado da Empresa Industrial Garcia, e portanto era caminho obrigatorio passar diariamente em frente a alfaiataria do Sr. Milico.Lembro que se tratava de uma liderança do nosso bairro e uma referencia muito boa.Eu tinha por habito, sempre olhar para dentro e ver aquele senhor calmo, envolvido no seu trabalho.
Parabens Adalberto por reviver o Sr. Milico.
Carlos Jorge Hiebert (russo)
Balneario Camboriu
Caro colega Beto.
ResponderExcluirQuem morou no Garcia e não conheceu o Sr. Milico.Todos nós que moramos nesta região do Garcia conhecia ele,inclusive sua filha Arlete trabalhou no D.R.H e eu tive o privilégio de trabalhar junto com ela.Conhecia muito bem a família toda .Como é bom que você. faz reportagens de pessoas simples humildes ,mas que fizeram histórias em nosso bairro. Como você fez de mim e meu pai,espero que as pessoas reconheçam sua dedicação para com a história de nosso bairro
Garcia.
Bom final de semana para você.
Osni Wilson Melin
Esse é mais um dos profissionais que hoje ficou obscurecido pelas lojas de departamentos. E aqui percebemos sua importância "naqueles tempos" pelo testemunho dos convites que recebia.
ResponderExcluirSempre morei pelas imediações da Furb (Vila Nova) e por isso foi mais um personagem blumenauense que eu conheci pelo seu blog. Só o depoimento de sua filha nos diz claramente seu exemplo como pessoa.
Abs, Claus.
Boa noite amigos,
ResponderExcluirGostaria de solicitar aos colegas historiadores do qual faço parceria com links no Construindo História HOje, se possível linkarem para este post ou direto para o Construindo História Hoje.
http://construindohistoriahoje.blogspot.com/2010/12/escapando-da-seducao-liberal.html
Desde já grato pela amizade,
Leandro CHH
Adalberto, que bom relembrar, minha família sempre morou na Rua Belo Horizonte e minha mãe gostava muito da Dona Muche, também sou colega da Natália - filha do Sr. Milico, fico muito orgulhosa de ter conhecido estas pessoas do bairro Glória que ajudaram a contruí-lo e deixaram um belo exemplo de dignidade humana! Parabéns à Arlete e a você! Anelore.
ResponderExcluirDe: suzelei@aol.com
ResponderExcluirFANTASTICO, li tudo que tinha para ler, segui todos os outros links.
Tenho vontade de chorar. Ainda bem que tem o Day para salvaguardar a nossa historia.
Boa semana, beijao
ResponderExcluirRoberto Gonçalves Sr Milico...Esse cidadão quem o conheceu vai estar vivo presente em todos que o conheceram..Grande profissional na arte de fazer trejes..fui um cliente assíduo alfaiate....bela recordação. ...
Edmundo Edi Milico merece nosso respeito.Nas decadas de 50/60 quando era vendedor da extinta Casa Peiter ele era meu amigo e cliente.
ResponderExcluirJulio Costa Seu Milico fez meu terno de casamento,seu Milico e dona Muchi,Pais dos meus colegas Jorge,João e Rosângela ela colega de serviço no Escr.Cont.Malheiros,saudades dessa época. Valeu Adalberto
ResponderExcluirSergio Da Costa Família fantástica
ResponderExcluirCelia Casas Nossa....ele fez o terno do casamento do meu marido...
ResponderExcluirFez ternos para meu pai o Mendonça...boa lembrança.
Superfã
ResponderExcluirValmor Pinheiro Fez alguns paletós para meu pai e meus irmãos minha mãe trabalhou alguns anos na casa deles.
Francisco Ramos Trabalhei na alfaiataria dele saudades
ResponderExcluirFafá Ramos Martins
ResponderExcluirHistória belíssima de mais um empreendedor nato, assim como tantos outros cidadãos que aqui demonstraram sua coragem, sua persistência e suas lutas. Parabéns à família!!!!
Madalena Kuehn
ResponderExcluirMeu pai Ervino Kuehn também era alfaiate. Neste dia 6 tinha até partidas de futebol no antigo Palmeiras. Só entre alfaiates. A data era comemorada. Além dos congressos em várias cidades Brasil afora.