Como
era o Pavilhão da Praça “Dr. Hercilio Luz”
Fazia um ano que havia terminado a Primeira Guerra Mundial. Blumenau em 1919, pelos padrões de hoje, não
passava de uma minúscula cidade do interior. A “Hauptstrasse”, Rua Principal, era
revestida de pedra britada.
Perto da Prefeitura ficavam o Correio, a Caixa Econômica, a
“Deutsche Schule” (Escola Alemã), o “Theaterverein Frohsinn) (Sociedade Teatral
Frohsinn), umas casas comerciais, um hotel e uma fabrica de Lacticínios. Já
havia casas de dois andares, como o “Hotel
Holetz” e as casas comerciais dos Srs. Katz Scheeffer e Jansen. Também
havia admiráveis casas construídas no estilo da época, fora as de estilo
enxaimel. Conservavam suas características até os nossos dias, a casa do Sr.
Rudolf Kleine, hoje “Casa das Louças”, a casa do Sr. Alvin Schrader onde
funciona hoje a “ Varig” e a “Casa Husadel”.
O
Vapor Blumenau era o mais importante meio de transporte entre Blumenau e
Itajaí. Além dos passageiros comuns das mercadorias e do correio, trazia levas
de imigrantes que procuravam aqui um novo lar, uma nova pátria.
A Praça “Dr.
Hercilio Luz”, defronte à antiga Prefeitura, era o principal
ponto de reuniões da cidade, que não parava de crescer. Esta praça e a Alameda
de Palmeiras na rua Duque de Caxias, estava sob os cuidados de Mathias G.
Fabian que possuía uma “Abricultura e Floricultura” na rua São Paulo. Ele
tinha aprendido as artes de agricultura e Floricultura na “Schlossgaertnerei”
de Heidelberg, que pertencia ao seu tio. Veio ainda moço, ´orfão, na companhia
deste tio para o Brasil. Quando não lhe restava mais nada de sua herança parou
em Blumenau. Aqui casou-se em 1914 com Frida Schoenfelder, também órfã, neta de Cristian
Schoenfelder, que veio em 1853 e de sua mulher Henriette, Nata Fischer, que
migrou em 1855 para o Brasil.
Mathias notou que havia poucas diversões na cidade e que as
pessoas que durante a semana toda trabalhavam de sol a sol, não tinham um lugar
próprio, para nos fins de semana , bater um papo e tomar umas bebidas.
Lembrou-se então de um coreto de praça na cidade de Heidelberg, na Alemanha,
onde se criara.
Este coreto atraia os cidadãos nos fins de semana. Era o
lugar onde se ria, conversavam , conhecia pessoas, começava namoros, bebia
vinho e cerveja, levava as crianças para passear e enfim se passava o templo
livre.
Por que não poderiam fazer a mesma coisa aqui? A ideia teve
o apoio do então superintendente municipal, Paulo Zimmermann e tornou-se
realidade. Foi lavrado em 1919, um solene contrato no livro próprio da Comarca
de Blumenau, pelo qual o Sr. Mathias G. Fabian se obrigava a construir um
“Pavilhão de Coreto de Música e Botequim”, na Praça Dr. Hercílio Luz.
Constava ainda do documento, que o contratante estava
obrigado a colocar no jardim da praça as mesmas mesas necessárias para o
serviço de restaurante, atendimento ao público todos os domingos e feriados.
O Pavilhão, como passou a ser conhecido, desde logo foi bem
recebido pela população, e como na velha Heidelberg, do outro lado do Atlântico,
tornou-se um ponto de encontro e lazer. A banda de música tocava, as pessoas
passeavam, se divertiam, tomavam vinho e cerveja, além de gasosa, do capilé e
da cachaça, tudo fabricado em Blumenau ou nas redondezas.
O coreto passou a ser um centro de convergência das
pessoas, já que no inicio da rua das palmeiras era o ponto de “carros de
mola” e também de ônibus puxado por dois pacientes cavalos, do Sr. Gustav
Grassmann, o qual fazia a linha do centro de Blumenau até o bairro de Itoupava
Seca.
O tempo ia passando, o Pavilhão abria também nos dias
úteis.
Agora os moradores do
interior, que tinham que fazer suas compras na cidade, pagar seus impostos ou
vender seus produtos agrícolas de casa em casa, faziam sua parada no Pavilhão.
Lá tomavam cerveja fabricada por Franz Hosang, Otto Berner Otto Jenrich, todas
produzidas em Blumenau e comiam um pãozinho. As mulheres e crianças gostavam de uma gasosa feita por
Luiz Probst e Otto Jensen ( ou de capilé). Fabrivcavam naquela época capilé, vinho de laranja e carambola, e os
fornecedores eram Ernst Siebert da rua São Paulo e Rudolfo Thomsen, da Velha
Central.
O segundo fabricante ainda o célebre “Bitter Estomacal”
muito requisitado. Até hoje, Sr. Thomsen, que mais tarde tornou-se proprietário
da fábrica de vinagre do Sr. Siebert, guarda a primeira nota fiscal que sua
firma extraiu no longínquo ano de 1929 e que tem como destinatário o Pavilhão
de Mathias Fabian.
Além dos pãezinhos tipo “bundinha” com queijo, salame, linguiça
e ovos preparados em casa, à clientela era atendida com docinhos, chocolates e
balas. Nos fins de semana havia cuca caseira especialidade de Dª Frida. Perto
do Natal não faltavam maçãs e peras estrangeiras, maçã-pão e a gelatina “Waldmeister”
importadas.
Nos fins de semana, em dia de festa ou eleições, havia um
suculento churrasco.
Na época os cigarros eram de palha, mas havia grande
sortimento de charutos como os dos “Irmãos Rothbarth”, de Blumenau, e Arthur
Buerguer, de Pomerode.
Em 1929, no governo de Curt Hering, o contrato foi
renovado por mais dez anos. O pavimento foi aumentado. Neste tempo Mathias
Fabian foi encarregado de projetar e executar a reforma e o embelezamento do jardim
público da “Praça Dr. Hercilio Luz”, Foram acrescidas novas árvores ás
já existentes, arbustos raros, árvores estrangeiras e semeadas flores. Bancos
de madeiras pintados de verde, com os pés de ferro fundido, foram colocados.
Todos os caminhos foram revestidos de uma camada de “Schamotte” coberta
de areia.
O “Schamotte” não prejudica as raízes das velhas e
preciosas árvores que até hoje são o orgulho dos Blumenauenses.
Bonito e aconchegante como se tornou o jardim, não faltavam
visitantes que ocupavam os seus bancos. Ao por do sol, quando o céu se tingia
multicolor, entre outras, o Sr. Arthur Koehler, proprietário do Jornal
Periódico “Der Urwaldsbote”, procurava seu lugar predileto num banco à
beira do rio Itajaí-Açu, com vista
para o lindo panorama da cidade.
A cidade cresceu muito, o ônibus puxado a cavalo foi
substituído por um motorizado. Inaugurou-se linha para o bairro da Velha.
Automóveis começaram a circular. A grande inovação da
Tecnologia moderna no Pavilhão foi um caça-níqueis, que fazia a alegria não só
dos jovens, como também de respeitáveis senhores de compridas barbas.
Surgiram também os clubes de futebol, O Amazonas E.C. o “Blumenauense”
hoje “Olímpico” o “Brasil”, depois “Palmeiras” e agora “Blumenau”,
festejavam suas vitórias no Pavilhão da Praça “Dr. Hercilio Luz”.
Foto: Jaime Batista da Silva
Em 1939 o contrato não mais foi renovado e acabou-se uma
tradição.
O pavilhão foi demolido, surgiu um posto de gasolina e mais
tarde, no mesmo local foi erguido o “Monumento dos Voluntários da Pátria” .
Erica Pantzier – Filha de
Mathias Fabian
CONTRATO
A
seguir vamos reproduzir os termos do contrato firmado entre o superintendente Zimmermann e o sr. Faban e que estabelecia o
seguinte:
Contrato para a construção de um pavilhão, na praça
Hercilio Luz, que faz a Municipalidade de Blumenau com Mathias Fabian.
Por este contrato, lavrado no livro de contratos da Câmara
Municipal de Blumenau, o Superintendente Municipal Sr. Paulo Zimmermann
e Mathias Fabian.
Por este contrato, lavrado no livro de contratos da Camara
Municipal de Blumenau Sr. Paulo Zimmermann
e Mathias Fabian, jardineiro, morador nesta Cidade, perante as duas
testemunhas (...) acordaram o seguinte: Clausula
Primeira: Matias Fabian obriga-se a construir até o dia 15 de
novembro próximo, na Praça Hercilio Luz, desta Cidade, em lugar
designado pela Municipalidade e de acordo com a planta por esta apresentada, um
pavilhão para coreto de música e botequim, e a colocar no mesmo jardim as mesas
necessárias para o serviço de restaurante que o contratante também se obriga a
manter, correndo todas as despesas por conta do mesmo contratante Mathias
Fabian.
Clausula Segunda: O Município
de Blumenau concede ao contratante, em compensação, isenção de todos os
impostos municipais. Durante o prazo de doze anos.
Clausula Terceira: Findo
este prazo de doze anos, o pavilhão passará a ser propriedade da
municipalidade, sem qualquer indemnização ao contratante, o que sucederá também
se, durante o tempo do contrato, o Mathias Fabian deixar de explorar o
estabelecimento, atendendo o público todos os domingos e dias feriados.
Clausula Quarta: A Câmara
Municipal de Blumenau obriga-se a não fazer concessão igual no jardim da Praça
Governador Hercilio Luz, durante os dozes anos de duração deste contrato. E
por se acharem deste modo contratos, fez-se este que vai assignado pelo
Superintendente Municipal e pelo outro contratante Mathias Fabian e pelas
testemunhas F.E.F, que a tudo estiveram presentes. E para os fins legais dá-se
ao presente o valor de (Rs. 600S000) seiscentos mil réis.
Revista Blumenau em
Cadernos; Tomo XXVIII/4; abril de 1987, Fundação Cultural de Blumenau e Arquivo
HJFS.