Cuidado com as bicicletas!
Esse era o alerta dado por meu pai quando o informava das
minhas idas à Blumenau para visitar os parentes e pelo que lembro, era a
primeira coisa que dizia toda vez que adentrávamos o estado de Santa Catarina, quando
das nossas viagens com ele ao volante.
Para ser fidedigno, as bicicletas começavam a povoar a
paisagem pelo estado do Paraná e é bom que se diga que nessa época, transitávamos
no asfalto somente entre o Rio e São Paulo e mais 60 km até Sorocaba, daí para
frente, terra, lama e buracos!
Os caminhões eram os donos da estrada e os outros veículos
somente davam as caras próximos às cidades. Joinville era a primeira das
catarinenses onde as bicicletas proliferavam, seguindo-se Jaraguá do Sul e,
evidentemente, Blumenau.
Lembro que quando chegávamos à cidade pela Rua São Paulo –
época anterior à construção da BR 101 -, dependendo do horário, era certo
trafegarmos por entre centenas delas, ciclistas homens e mulheres que iam ou
voltavam das fábricas em mais um dia de trabalho.
As destinadas às mulheres não possuíam a barra transversal
que unia a base do guidão ao selim, facilitando o acesso quando suas donas
usavam vestidos ou saias. Contavam ainda com protetores de corrente e sobre o para-lama
traseiro eram equipadas com uma espécie de rede que impedia as barras das vestimentas
se enroscassem nos aros das rodas quando em movimento. Acessórios como bagageiro
traseiro, espelhos e buzinas eram comuns.
Já as masculinas possuíam a tal barra e além do bagageiro
traseiro, quando existia, podia-se transportar mais um passageiro sentado sobre
ele. Não era nada cômodo, mas funcionava.
Sob sol ou chuva, estavam sempre presentes e não lembro ter
presenciado ou ter notícia de acidentes envolvendo ciclistas, muito embora acontecessem.
Roubo das mesmas eram ainda mais raros. Recordo que se podia registrá-las como
se faz com os veículos e a Prefeitura emitia uma plaqueta para afixação no quadro.
Nas manhãs ou nos fins da tarde, as bicicletas tomavam as
vias da cidade e não havia qualquer exclusividade para o deslocamento dos
ciclistas, a não ser a civilidade!
Hoje, a bicicleta assumiu
novo status. Continua a ser usada como meio de transporte, entretanto, adquiriu
o glamour do lazer e nos grandes centros contando não somente com equipamentos
como capacetes e luvas, como também ganharam faixas exclusivas para que os
novos ciclistas se desloquem com mais
segurança.
A iniciativa foi importada
de cidades como Paris ou Londres e não há como negar que a iniciativa foi um
sucesso. Entretanto, não podemos nos iludir que tais metrópoles possuem um
sistema viário integrado e uma malha viária que atende a população, realidades
opostas diametralmente à nossa, além da educação dos motoristas de lá, que é um
capítulo a parte.
Por aqui, nossos governantes
tupiniquins inseriram as bicicletas e como somos o país do jeitinho, a nossa solução
surrupiou um espaço das vias já apinhadas de veículos e o resultado que se vê, nos
horários de picos de tráfego, são ciclovias desertas e ruas engarrafadas.
Alguém levantará que a falta
de segurança é o verdadeiro fator que inibe o uso maciço das bicicletas, - nos
últimos meses se registraram no Rio de Janeiro, vários casos de roubo seguido
de morte.
Sugerirão alguns sobre por
que não se adota a solução que Blumenau adotou no passado, quando as bicicletas
tinham placas de identificação e a resposta é muito simples: se qualquer
prefeitura regulamentar essa prática, ou qualquer outra, serão obrigadas
prestar a reciprocidade, ou seja, policiar e coibir o roubo, responsabilidade que
qualquer prefeito não quer nem de graça. Preferem, como o do Rio, se valer do
famigerado pacto federativo de mil e novecentos e antigamente e lavar as mãos
como Pilatos, enchendo o peito para dizer que o problema da segurança é do
governo do estado!
Francamente! Vivemos em
cidades - ou municípios -, e o conjunto deles formam os estados, que não passam
de uma mera abstração política/geográfica. Vide o caso de Paraty, que durante
anos integrou o estado de São Paulo e hoje em dia é carioca. A própria cidade
do Rio de Janeiro foi, durante anos, a capital do estado da Guanabara e por
conta de um simples decreto deixou de existir, incorporando o estado do Rio de
Janeiro, cuja capital era a cidade de Niterói.
Esse arcaico pacto
federativo estabelece que é de responsabilidade das prefeituras oferecer aos
cidadãos serviços como saúde, educação, habitação, etc., etc, aos estados cabe
a segurança, etc., etc, e à união, etc., etc.
Tal esquartejamento de responsabilidades enseja o famoso jogo de
empurra e via de regra, o governo federal, situado no final da linha, quem paga
a conta da inércia de atitude que hoje vivenciamos.
Quem sabe do que acontece na
vida cotidiana das cidades, seus problemas e as soluções são as prefeituras.
Que o estado e a união fiquem com as políticas globais.
Como dizia o Tim Maia, Chama
o síndico!, mas até que eles deem as caras, não custa relembrar o alerta do meu
pai, em Blumenau, no Rio ou em qualquer cidade: Cuidado com as bicicletas!__________________________
Adendo de: José Geraldo Reis Pfau
Relatório da Prefeitura de Blumenau ano de 1965
BLUMENAU DE BICICLETA
1965
- O Prefeito Hercilio Deeke
em seu relatório dos negócios administrativos do ano, encaminhado a Camara de
Vereadores - apresentava as ações de sua gestão. São documentos do Arquivo
Histórico de ano a ano na gestão daquele administrador. Eram dados de
todos os setores da vida da comunidade como da economia, da educação, da
agricultura, da saúde, obras, investimentos etc. Constam no documento que em 1965 eram 42.000 as
bicicletas nas ruas de Blumenau.
Há
50 anos (junho 2013), portanto rodando na mesma malha básica de ruas de hoje,
se considerarmos os corredores principais.
Movimentavam-se
ainda o transito da cidade mais 235 motocicletas, 622 motonetas (Lambretas
e Vespas). Essa quantidade de
veículos de duas rodas intensificava o transito no transporte dos moradores
somados com 114 ônibus, mais 2.211 automóveis particulares, 108 automóveis
de aluguel (taxi), 226 jipes e 537 caminhões. É importante ressaltar que as
bicicletas eram o transporte da família. Marido e esposa
usavam diariamente para se deslocar de casa para o trabalho. As garagens de
bicicletas nas indústrias blumenauenses eram grandes espaços cobertos. O
relatório do Prefeito registra ainda que o salario mínimo em Blumenau em março
de 1965 era de Cr$ 60,000,00
(sessenta mil cruzeiros). Já no recenseamento feito em 1960 consta que
67.092 era os habitantes, sendo 64 mil na cidade e 3 mil na zona rural
(Itoupava). E 13.733 eram os domicílios no mesmo ano 60. Num exercício podemos
afirmar que 70% da população tinham a sua bicicleta e que em cada casa teria três
bicicletas.
Texto/Flavio Monteiro de Mattos
Acervo: Internet/ José Geraldo Reis Pfau e Adalberto Day
Junho 2015
Bicicleta era o meu meio de transporte da casa de meus pais na Itoupava Norte até a Rádio Nereu Ramos todos os dias as 5h30 da manhã quando eu participava como locutor comercial, e as vezes apresentava o programa Rádio Sequências NR comandado brilhantemente pelo saudoso Alfredo Otto Flatau. E ainda apresentava o Antena Esportiva dentro do programa. Eu tinha uma Monark barra dupla e cruzava as ruas de Blumenau todos os dias. Da casa de meus pais até a Nereu eram aproximadamente 7 a 8 km. descendo pela Rua São Paulo, 7 de Setembro onde ficava a sede da Nereu. Hoje as bicicletas ganharam espaço especial nas grandes cidades. Criaram-se as Ciclovias, muitas de forma irregular, prejudicando os pedestres e ao mesmo tempo a circulação de veículos, especialmente aqui em Curitiba e em São Paulo. Gostei da matéria, muito boa.
ResponderExcluirEdemar Annuseck
Curitiba - PR
Ótima recordações de nossa juventude. As tais plaquetas das bicicletas eram trocadas anualmente e tinham cores diferenciadas a cada ano para facilitar a fiscalização. Vencido o prazo de renovação anual os guardas de trânsito da Prefeitura montavam inspeções nas proximidades das garagens de bicicletas das empresas nos horários de saída dos operários, ficavam na primeira curva depois da garagem. No caso da EIG ficavam onde seria construída mais tarde a Praça Getúlio Vargas. As bicicletas sem as placas novas eram apreendidas e colocadas num caminhão a prefeitura, ao proprietário restava a necessidades de ir até a cidade, pagar as taxa devidas, pegar a nova placa e recuperar a sua bicicleta. Outra curiosidade ocorrida na garagem de bicicletas da EIG foi o desaparecimento eventual de algumas delas e sempre pertencentes a alguém que era do segundo turno, ou seja, saia às 22 horas. Depois de algumas investigações descobriu-se que um funcionário do primeiro turno que trabalhava na Sala do Pano e que não tinha ido com a sua bicicleta em determinados dias simplesmente pegava a bicicleta de alguém do segundo turno. Vale lembrar que nos anos 60 a EIG tinha mais de 2.000 empregados. O roubo só era descoberto depois da 22 horas. Apertaram o ladrão para saber o paradeiro das várias bicicletas até então roubadas. O amigo do alheio revelou que ao sair do seu turno de trabalho escolhia uma bicicleta e não ia para sua casa na rua Progresso, mas sim para a região da Ponte do Salto, onde existiam casas muito conhecidas na cidade e nelas residiam moças da mais elevada rePUTAção. Os serviços ali prestados exigiam remuneração e o gaturno efetuava o pagamento dos relevantes serviços entregando as bicicletas que roubava de seus colegas da EIG.
ResponderExcluirMeu caro Adalberto,
ResponderExcluirAtravés deste texto(história), como não recordar da garagem da Artex , onde existiam lugares específicos para as centenas,ou milhares de bicicletas dos funcionários da referida empresa.
Pois também ganhei uma, barra circular azul de meu finado Pai,quando comecei a trabalhar na extinta Cooperativa Artex. Tínhamos o hábito de lavar a mesma aos fins de semana,até porque sabíamos que tinha algumas prestações a serem pagas na loja Prosdócimo. Que saudades desta época, por isso sou seu fã incondicional nestas histórias, e seu trabalho,parabéns.
Beto
ResponderExcluirMuito legal esta matéria
Sou fã de bike desde criança, foi meu primeiro meio de transporte tanto quanto morava em Botuverá, como quando cheguei em BNU 11/1980.
Atualmente não uso mais a bike como meio de transporte, mas gostaria que voltasse a ser o meio de transporte predominante, viveríamos melhor e a natureza iria agradecer.
Adoro andar de bicicleta, me faz bem pedalo 2 a 3 vezes por semana com uns amigos como lazer e pra mexer o esqueleto rsrsrsrsr.
Alem de fazer exercício a bike proporciona apreciar a natureza, sensação de liberdade e a gente vê coisas que não vemos quando passeamos de carro ou de moto, alem de não ferir nem prejudicar o meio ambiente.
Abração boa semana
Maestrinho
LC Maestri
Mais um belo texto do primo Flavio Monteiro de Mattos. Suas recordações, bem humoradas e sempre dignas de credibilidade, nos remetem à velha, pacata e boa Blumenau.
ResponderExcluirPrezado Adalberto,
ResponderExcluirVi um artigo seu sobre a Revista do Esporte.
Parabéns pela bela coleção.
Pesquiso futebol brasileiro na primeira metade da década de 60.
Há uma contracapa da Revista do Esporte (preto-e-branco, por conseguinte), de 1963 (ou de 64?) sob o título "cinco para uma vaga", com foto dos cinco goleiros do flamengo à época: marcial, Mauro, Fernado, Valdomiro e Joélcio.
Você teria esse exemplar?
Grato,
Atenciosamente,
M.
Esqueci d efornecer meu novo e-mail para eventual resposta: m1rouanet@yahoo.fr
ResponderExcluirAmigo Beto mas eu não entendi quando você diz que as bicicletas tinham buzinas desculpe não era buzina eram cornetas que através de uma borracha fazia fomm fomm igual o antigo sorveteiro. As bicicletas elas faziam alarme de atenção de estrada através de uma tradicional sineta que era impulsionada em giros, através de pressão do dedo polegar e outra mas importante e cara, era presa no garfo da bicicleta e apoiava na lateral do pneu quando desejo do ciclista, também lembro da cadeirinha de vime que era colocada no guidom da bicicleta para levar crianças, outro acessório importante era o farol que que tinha o funcionamento através do dínamo colocado ao lado da roda da mesma para fornecer a energia elétrica que nas ruas não existia, fora a bicicleta umas das peças mas procuradas pelos ladrões era a bomba para acompanhar com segurança o proprietário, na época se classificava as marcas de acordo com as posses financeiras de cada dono, essas marcas podem hoje responder por altos custos depois de estarem totalmente restauradas e todas as peças originais, podem passar de 5.000,00 cada dependendo do seu proprietário .
ResponderExcluirBeto abraços Valdir Salvador
Boa tarde amigos, estou restaurando uma bicicleta Centrum ano 1951, vocês lembram qual seria a cor da placa no estado de SC na época que eram registradas?
ResponderExcluirDesde já obrigado e bela historia.
Att
Meu e-mail para uma possível resposta triangulo.recrutamento02@gmail.com
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