Apresentamos mais um texto de Flavio Monteiro de Mattos,
Carioca de nascimento e BLUMENAUENSE POR OPÇÃO". Nos relatando sobre Jorge Dória.
O
Último Ato de Um Grande Ator
Com
a morte de Jorge Dória (12/12/1920 - 06/11/2013), o plantel de comediantes e humoristas brasileiros
torna-se cada vez mais árido e suscetível que se descubram “talentos” tão
risíveis que, comparados ao quilate da turma a qual o Jorge fez parte, não
encontrariam oportunidades sequer para uma réles figuração.
Foto 1959: Anthero Frota de Mattos e Nagel Mello
Meu
pai foi amigo do Jorge desde a época em que usava Pires Ferreira, seu sobrenome
de batismo. Conheceram-se no Colégio Militar do Rio e por conta respectivos
dotes artísticos, precoces e incomuns, se tornaram amigos de várias estrepolias
e a mais “espetacular” protagonizada pela dupla foi a fuga do serviço, em pleno
carnaval, dentro do caminhão que fornecia carnes e outros víveres. Segundo meu
pai, esgueiraram-se para dentro do veículo, que rodou por algumas horas e
quando finamente parou, e as portas da “liberdade” se abriram... Estavam no
pátio do quartel do Exército, em Deodoro, que culminou com o convite para que
se retirassem da instituição.
Quis
a vida que os dois novamente e já adultos se reencontrassem e novamente sob os
auspícios de um órgão federal chamado, na época, de Caixa de Amortização, que
veio a ser o precursor do Banco Central. Além do Jorge (ainda Pires Ferreira),
a Caixa era o porto seguro onde ancoravam projetos de futuros astros como meu
próprio pai (primeiro seresteiro do Oswaldo Sargentelli do programa “Viva Meu
Samba”, na rádio Mundial AM), Miltinho, (cantor, que ainda está vivo), Pato
Preto (comediante, trabalhou na antiga TV Tupi, no programa Clube do Guri - http://pt.wikipedia.org/wiki/Clube_do_Guri).
Foto divulgação.
Nessa
época, o Jorge Dória já caminhava rumos aos palcos, tendo feito alguns papéis
em peças teatrais. Relatava meu pai que quando o Jorge colocava o paletó no
encosto da cadeira e dizia que ia comprar cigarro, era a senha que estava
ensaiando e não tinha hora para voltar.
Lá
por volta de 1961 ou 62, não tenho certeza, o Jorge já Dória apareceu lá em
casa, por volta da hora do jantar, animadíssimo porque fora confirmado no filme
O Assalto ao Trem Pagador
Foto divulgação.
(http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Assalto_ao_Trem_Pagador), no qual faria o delegado encarregado
de prender o bandido Tião Medonho. Além de querer partilhar a boa notícia,
queria a ajuda do meu pai para compor a caracterização do personagem que
fugisse ao estereótipo do delegado de polícia da época que, segundo ele, era
obrigatoriamente magro, de cabelos pretos e bigodinhos finos. Meu pai, frequentador e fã de Blumenau, sugeriu-lhe que incorporasse um delegado da
cidade, que conheceu através do cronista Nagel Mello e o Jorge Dória gostou
tanto da sugestão que levou para as telas um delegado alto, louro e sem os
bigodes que tanto execrava.
Ainda
sobre o filme, durante a gravação foram inúmeras as vezes que o Jorge Dória
surgiu lá em casa e nestas ocasiões trazia debaixo do braço os diálogos,
distribuindo-os para meu pai, minha mãe e às vezes para mim, para que os
ajudasse a decorar suas falas.
O
sucesso do filme foi estrondoso e o Jorge Dória chegou a programar uma ida à
Blumenau conosco, mas nunca aconteceu, já que se tornou merecidamente famoso.
Foto divulgação: Jorge Dória
Em
1974, estrelou a primeira versão tupiniquim da Gaiola das Loucas, talvez o seu
maior sucesso no teatro. Perto do fim da temporada fui assisti-lo e meu pai
sugeriu que o procurasse. Cheguei ao teatro mais cedo e pedi que o chamassem,
mas temia que não se lembrasse de mim, como de fato aconteceu. Somente quando
foi informado que o filho do Anthero o procurava é que apareceu e do hall do
teatro, vestindo camiseta regata, cuecas samba canção, meias e sapatos sociais,
perguntou, com seu jeito gaiato: - Por que não disse que é o Antherinho?
Engrenando
na TV tornou-se o primeiro Lineu da Grande Família. Passamos a vê-lo nos
programas de televisão, mas volta e meia meu pai comentava que tinham se
encontrado.
Ainda
nos encontramos por algumas vezes. Uma delas foi na fila do caixa de um supermercado,
em Ipanema, e ao lhe apresentar minha filha Patrícia, achou-a muito parecida
com minha mãe. A última foi no aeroporto Santos Dumont. Eu embarcava para São
Paulo o dono da empresa para qual trabalhava e o Jorge Dória aguardava alguém
vindo da mesma cidade. Quando me aproximei dele, foi logo dizendo que eu estava
a cara do Antherinho (!) e meu deu dois beijos.
Tenho
certeza que a partir de hoje, as noites celestiais serão muito mais animadas e
divertidas.
Obrigado,
Jorge Dória. Vamos sentir sua falta!
Arquivo divulgação.
Que surpresa, Adalberto, encontrar aqui um amigo pessoal de Jorge Dória! Ele entrou na minha vida um pouco mais tarde, através do Lineu da Grande Família, em pleno período traumático da Ditadura, fazendo todos nós rirmos de uma classe média que ainda não mudou nada (talvez piorou!). Lembro de episódios inteiros da Grande Família de então tanto ela me marcou!
ResponderExcluirDeixo aqui, consignadas, as saudades, desde já, desse grande ator.
Urda Alice Klueger
Bom humorista todos nós sabemos! Mas que humildade hein?! Bela história! Vai deixar saudades e boas lembranças.
ResponderExcluirBom dia
ResponderExcluirBela reportagem.
Considero Jorge Dória um grande ator. Lamentamos o seu passamento e a falta que haverá na TV e no teatro.
abraço
gervasiotessaleno@hotmail.com
ResponderExcluirCaro Adalberto: Realmente, postei um comentário sobre a crônica do Dória, que infelizmente foi pro beleléu. Vou repeti-la na esperança de que o Flávio a receba:
ResponderExcluir"Minhas irmãs, Júlia e Lígia, me mandaram tuas crônicas. Li até agora a do Jorge Dória. Gostava dele de carteirinha. Assisti ao Assalto ao trem pagador e desconfio ter conhecido o tal delegado loiro de Blumenau, no qual ele se inspirou para o papel no filme do Reginaldo Farias. Também o vi vivendo o Renato em A gaiola das loucas, ao lado do Carvalhinho, no Teatro Álvaro de Carvalho, em Floripa. Só desconhecia sua participação na Grande Família. Lineu só conheço a performance do Nanini.
Vivi no Rio de Janeiro, tua terra, no início dos anos 60. Bossa Nova e outras bossas. Ao pisar nas areias de Copacabana e Ipanema, virei carioca de pronto. Afinal "ser carioca é um estado de espírito". Atribuem a frase ao Vinícius, Millôr e Nelson Rodrigues. Não importa o autor. Ela é de uma verdade verdadeira.
Soube pelas manas, mais Carminha Vianna, que pousavas na Alameda Rio Branco, tempo de férias. Lamento não me recordar de ti.
Completo este ano 50 anos de jornalismo. O meu gênero (acho que o domino)
é a crônica, doce crônica (título do meu segundo livro). Aposentei-me como professor de Português, mas a caninha de todo santo dia é escrever.
Vou devorar os outros escritos teus e comentá-los sob a santa proteção do Adalberto Day. Toma um abraço, como diria o meu cronista preferido e inspirador Antônio Maria, compositor também de primeira água. Gerva, aquele que nem sempre enerva.
Gervásio Tessaleno Luz