OS PRIMEIROS
TEMPOS em Blumenau
José Ferreira da
Silva
Reprodução
Pelos relatórios deixados pelo Dr. Hermann Blumenau podemos,
hoje, fazer urna ideia, mais ou menos exata, de corno foi formado o povoado que
ele fundara às margens do Garcia
e do Velha e certas
particularidades da vida da Colônia que, de outra forma, se teriam perdido para
a posteridade. Mas houve, também, visitantes e colonos que escreveram muita
coisa interessante a respeito dos primeiros anos de Blumenau. Nesse particular, algumas cartas de colonos a
amigos seus, na Alemanha, e a parentes são muito preciosas. Felizmente, muita
coisa ainda nos ficou a esse respeito. Em 1903, um antigo colono de Blumenau
publicou num Calendário, escrito em
alemão e editado em Joinville, urnas memórias muito pitorescas a respeito
das impressões que lhe ficaram da sua chegada à nascente povoado do Dr. Blumenau. Convém traduzir uns
trechos dessas memórias. Esse colono, cujo nome, entretanto, não consta do
escrito, chegou a Blumenau em 1856, juntamente com outros imigrantes,
que formavam um pequeno grupo, e os quais eram tratados, pelos que já aqui se
achavam estabelecidos, de "alemães novos". Eram todos bem pobres,
corno era a grande maioria dos imigrantes que para cá veio, mas agricultores
ativos e trabalhadores. Era verão, bem próximo do Natal, quando eles chegaram à chamada
"Stadtplatz", que quer dizer local da cidade, que nada mais era do
que a sede da Colônia.
Reprodução
E o colono acrescenta ironizando: "0 local, sem dúvida, estava ali à vista, mas a cidade,
onde estava?" E continua: "Desta nada se via. Havia urna única
construção a que se poderia dar o nome de casa. Nela estava instalado o único
negócio do lugar, ou melhor, de toda a Colônia e também o escritório do Diretor
da Colônia. As outras moradias não eram mais que miseráveis choupanas, algumas
ainda abertas, cobertas de palha. Algumas dessas edificações, legitimamente brasileiras,
estavam ocupadas por urna companhia de soldados que ali se encontravam corno
guardas de proteção contra eventuais assaltos dos bugres. Mas a sua principal
ocupação consistia em caçar e pescar e, quanto ao mais, eles ficavam afastados
dos imigrados o mais possível. Para o povoado mesmo eles eram realmente urna
proteção que não era para se desprezar, mas os colonos do interior, mais
distantes da sede, esses teriam que se proteger por si mesmos. Onde hoje se
erguem prédios majestosos, havia, então, só mato, árvores ao lado de árvores, a
floresta virgem. Nesta, os macacos e muitos outros animais se amontoavam,
apesar dos muitos caçadores que havia. Não muito longe da foz do Garcia no Itajaí, ficava a casa mais
importante para nós, recém-vindos: o barracão
dos imigrantes". Antes de irmos adiante com a descrição desse
barracão, precisamos dar alguns esclarecimentos para a melhor compreensão da
narrativa do nosso colono. A única casa da povoação que merecia mesmo esse nome
e onde o autor diz que estava instalado o escritório do Dr. Blumenau, fora a
primeira casa de alvenaria construída em Blumenau e ficava ao lado do atual
prédio da Biblioteca Pública. Era urna casa de dois andares, construída, em
1852, por Guilherme Friedenreich,
que viera dois anos antes, com os 17 imigrantes, fundadores de Blumenau. Nessa
casa, realmente, o Dr. Blumenau alugara dois quartos: Um para o seu escritório
e outro para uma venda que fornecia aos colonos gêneros de primeira necessidade
e outras mercadorias. O barracão de imigrantes ficava, mais ou menos, onde hoje
está (esteve) a estátua do Dr. Blumenau,
no começo da rua das Palmeiras.
Na Alameda
Duque de Caxias (permanência de 32 anos - de 1967 a 1999)
Foto - Arquivo H. José Ferreira da Silva
Vamos ver como o nosso colono-escritor
descreve esse barracão: "0 aspecto dele não era muito convidativo.
Tanto no exterior, como no interior, a sua aparência era das mais lamentáveis.
Era cumprido e estreito e dividido em muitos compartilhamentos que parecia mais currais de ovelhas que outra
coisa. naturalmente, havia sido construído só de palmitos e a cobertura era de folhas
de palmeira. As paredes eram de pau-a-pique e haviam sido uma vez cobertas de
barro. Mas como, de tempos em tempos, o Garcia transbordava, provocando
enchentes que atingiam o barracão,
o barro havia caído e jazia, misturado com lama, no chão, dentro e fora do
barracão. Janelas e gateiras tinham sido julgadas desnecessárias e a porta
ainda não havia sido colocada na abertura a qual, assim, fornecia uma farta
ventilação para o interior. O soalho era de terra batida, que haviam esquecido
de aplainar. E, para completar o quadro, uma junta de bois havia feito do
Barracão seu quartel general e os quais, de quando em quando, inundavam de um
para outro compartilhamento, deixando em cada um deles evidentes e legítimos
sinais de sua ocupação. A pobre construção fora demolida "Casa de Recepção de Imigrantes" e as respectivas divisões
eram chamadas quartos. Os imigrantes recém-chegados, por felicidade, não haviam
ainda esquecido os trabalhos que haviam passado a bordo do navio que os
trouxera e por isso ocupavam o barracão sem reclamar. Somente alguns, que, na
Alemanha, tinham visto melhores dias, estavam a resmungar coisas que, certamente,
não eram lá muito lisonjeiras. Mas, de que poderia servir agora? Agora era
tocar para diante e levar tudo pelo melhor, com paciência e alegria. E, realmente,
as coisas se sucederam de maneira melhor do que a esperada. Uns ajudavam os
outros a suportarem e a se acostumarem à nova pátria e ao novo lar e, em pouco tempo,
também o Barracão se tornara habitável e suportável. Realmente, para nós, que
tivemos que ocupar o barracão de imigrantes, foi aquele, o pior tempo que
passamos. Não havia ajuda pecuniária por parte do governo; a maioria era paupérrima
e alguns até estavam carregados de dívidas quando aqui chegaram e trabalho
renumerado era bem raro. Ainda por cima tínhamos que suportar um calor medonho
e prolongado, os insetos de que a gente não sabia como se livrar, a mudança de
alimentação, os inconvenientes da aclimatação etc. Muitos também sentiam
saudades. Mas, o remédio era fazer tudo por acostumar-se. Para alguns a coisa
foi fácil. Mas outros, só a duras penas, com muitas lágrimas e suspiros podiam
esquecer a velha Pátria distante que
nunca mais veriam. Realmente, é duro destacar-se da terra em que se nasceu e
onde se passou a mocidade." Eis como o nosso colono-escritor viu e sentiu os primeiros anos de Blumenau.
E, como ele, todos os que para cá vieram, tiveram os seus dias de tristezas e sofrimentos
até que pudessem contemplar,
felizes, a grandeza da nossa terra e também fruir do bem-estar
de nossa gente.
Para saber mais
sobre a história de Blumenau acesse:
Revista Blumenau
em Cadernos – Julho de 1968 Páginas 122,123.
Bom dia Professor! Só me resta dizer de toda a minha admiração,respeito por esses imigrantes. Vieram do tudo pra o lugar algum e lutaram muito por suas vidas e fazer de Blumenau e região o que temos nos dias de hoje. Obvio que muitos anos se passaram,mas sem a luta e muito trabalho dos que vieram primeiro o que seriamos hoje? E também meu agradecimentos aos historiadores,poie se não fossem eles não teríamos tão belas historias,e nos faz crescer ainda mais como seres humanos. Obrigado Professor e meus agradecimentos a todos. Grande abraço!
ResponderExcluirExcelente relato.
ResponderExcluirNo Brasil ainda existe assoalhos de terra batida.
Barro branco na parede, casa de pau a pique.
Chão limpinho, encerado com fezes de boi.