quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

- Jornais de Fofoca

BAÚ DA SAUDADE
Por Carlos Braga Mueller 
Carlos Braga Mueller
JORNAIS  DE  FOFOCA: BLUMENAU  TEVE  VÁRIOS....
Hoje em dia os jornais que circulam em Blumenau dedicam amplo espaço  a colunas voltadas para os problemas do dia a dia do município, ensejando a que surjam várias opiniões sobre cada assunto, geralmente desencontradas, originando quase sempre extremadas opiniões dos leitores, expressas e reproduzidas em colunas a eles dedicadas.

Em cada cabeça, um pensamento.
E é assim que surgem as “fofocas”, começando pelas rodas dos que matam seu tempo tomando um cafezinho no bar, e que se estendem, invariavelmente, às páginas dos jornais.
Mas este gostinho de fazer fofoca nas páginas dos jornais em Blumenau não é de hoje.
Começou lá no início do Século XX e aproveitava a época do carnaval (sim, já tinha carnaval por aqui naqueles tempos) para mostrar as “garras”, fofocando a torto e a direita sobre os moradores da então pacata cidade fundada por Hermann Blumenau.
Geralmente eram jornaizinhos que apareciam e desapareciam em poucos meses.
Mas houve alguns que duraram mais tempo e eram temidos pelos habitantes da cidade, porque colocavam a vista tudo o que de bom (ou ruim) acontecia por estas bandas.
Se num baile a menina olhasse para um determinado mancebo, na semana seguinte a fofoca estava no jornal, às vezes citando o nome dos envolvidos, outras vezes dando somente pistas sobre os envolvidos no “affair”. 

DIE SCHNAUZE, O “BOCA GRANDE
Em 28 de fevereiro de 1920 circulou em Blumenau o número 1 do jornalzinho “Die Schnauze”, que trocando em miúdos significava mais ou menos a expressão “boca grande”. E isso é o que ele era. Foi lançado para comemorar o primeiro aniversário da Sociedade Musical Lyra, que tinha sua sede no Teatro Frohsinn.
Teve vida longa entre os jornais carnavalescos e editou 17 números até fevereiro de 1936, um por ano. Publicava muitas críticas ferinas; era temido porque atingia autoridades e por isso enfrentou processos judiciais.

A ORTIGA
Grafado erroneamente, “A Ortiga” (ao invés de Urtiga) apareceu no carnaval de 1924 e não saiu do primeiro número. Segundo o historiador José Ferreira da Silva em seu livro “A Imprensa em Blumenau”, trazia apenas críticas a pessoas da sociedade local , redigidas com pouca graça e nenhum senso de humor. Tinham tanta coragem que seus redatores assinavam como “Eu, tu, ele”.
O ESPIÃO
A medida em que os anos iam passando, novos fofoqueiros surgiam. Em 1926 apareceu um jornal intitulado “O Espião” que se auto intitulava “órgão crítico e noticioso.”
Segundo consta não passou do número 8. Na edição nr. 7 estava a pleno vapor uma pesquisa entre os leitores para se saber qual era a mais bela “senhorinha” de Blumenau. Um cupom publicado no jornal dava o direito de votar.
O número 8 trazia o resultado do concurso: 19 integrantes da sociedade blumenauense de 1926 receberam votos. Nos primeiros lugares despontaram as senhoritas Luiza Landriane, com 458 votos, Wally Schneider com 380 votos, e Yolanda Rodrigues com 360.
O jornal mandou um recado à vencedora:
“Tendo tirado o primeiro lugar neste concurso a gentil senhorita Luiza Landriane, a mais bella de Blumenau segundo a opinião popular, fica a mesma convidada  para honrar com sua presença a domingueira a realizar-se hoje às 3 horas da tarde  no Salão Holetz na qual lhe será feita a entrega do brinde que temos o prazer de lhe offerecer.” (grafia da época)
O CYCLOPE
1928. Ano em que surgiu o jornalzinho O Cyclope”. É bem possível que seus responsáveis fossem os mesmos do abortado “A Ortiga”, porque também se identificavam como “Eu, tu, ele.”
Na edição número 3, de 29 de setembro de 1928, o jornal deixava a fofoca de lado para registrar o quarto aniversário do semanário “A Cidade”, conduzido pelos jornalistas Octaviano Ramos e José Ferreira da Silva.
Destaque para as páginas 3 e 4, com anúncios em quadros, certamente um precursor local dos “tijolinhos” publicitários.
DER MOSQUITO 
Se até agora estes jornais de fofoca eram redigidos em português, em 1930 apareceu em Blumenau o “Der Mosquito”, em língua alemã. O número 1 circulou no dia 22 de fevereiro daquele ano.
O “Der Mosquito” era patrocinado pelo Clube dos Atiradores Schützenverein Neue Velha.
Trazia críticas leves aos sócios do clube. Do número 4 ao 6 apareceu tendo como responsável a seção de cantores da mesma sociedade de atiradores, a Gesangs-Absteilung.
Existiu até 1935, embora só fossem editados mais 5 números, encerrando sua vida com o número 6, em 2 de março de 1935.

O BISTURI
Em 1931 circulou, em 31 de maio, “O Bisturi”, dizendo-se “órgão oficial do Bloco do Chantin”. Tinha como diretores J.Castro e P.V.Cunha, que bem poderiam ser  pseudônimos, porque no próprio expediente vinha gozação:
“Repórter: qualquer desocupado,
Expediente: depois das dez.”
E ainda acrescentava:
“Distribuímos esmolas só aos sábados e aceitamos donativos monetários”.
Apareceu até o número 16.
José Ferreira da Silva escreveu sobre ele que “era um jornalzinho de brincadeiras e blagues inofensivas, tão ao gosto dos mocinhos daqueles idos”.

DIE QUASSELBUDE
O ano era 1932 e surgiu outro órgão em alemão, “Die  Quasselbude”, qualquer coisa como “celeiro de tagarelas”.
O número 1 circulou no dia 23 de janeiro e era editado pela Sociedade dos Cantores Concórdia, sediada no Bom Retiro.
Abaixo do título trazia inscrito, em alemão:
“Quem sentir coceira, que se coce. Nós não somos responsáveis.”
O número 2 apareceu no carnaval de 1933 , o número 3 em janeiro de 1934.
Publicava críticas bem humoradas sobre associados e autoridades.
1934 – RECORDE DE PUBLICAÇÕES

Em 1934, ainda circulando o “Die Schnauze”, apareceram mais alguns jornais de fofocas:

A FOLIA – Este jornalzinho crítico circulou no carnaval desse ano e não passou do número 1.

KCT – O “KCT” era bimensal. Trazia críticas e piadas. Teve vida curta. Começou em abril de 1934 e não foi além do número 7.

PIRANHA – No mesmo ano surgiu o “Piranha”, jornal crítico e humorístico, mas que também não passou do número 5.

O TINHOSO – No dia 1º de abril de 1934 circulou o número 1 de “O Tinhoso”, uma alusão ao diabo. Não passou do número 2, pois foi proibido de circular pela polícia: criticava autoridades estaduais, principalmente em razão de Blumenau ter perdido grande parte do seu território, desmembrado em vários outro municípios. Essa insatisfação dos blumenauenses contra o governo estadual resultou na campanha “Por Blumenau Unido”, de resultado infrutífero.

FINAL
Não se encontram registros de novos jornais fofoqueiros a partir de então, pois durante o “Estado Novo” de Getúlio Vargas (1937/1945) a imprensa era vigiada severamente pelo DIP-Departamento de Imprensa e Propaganda, uma espécie de polícia política de Vargas, instituída para censurar  rádios, cinemas, jornais e revistas.
Foi então que foram sendo fechados os jornais que eram editados em língua alemã e começou o movimento de se “abrasileirar” os alemães e seus descendentes, embora alguns já tivessem nascido no Brasil. Mas carregavam a cruz de ser filho ou filha de um alemão.
Mas esta já é outra história...
Nota:
Os dados do presente trabalho devem-se, principalmente, a meus familiares, que me legaram exemplares de jornaizinhos de fofocas e, também, ao que José Ferreira da Silva deixou registrado em seu livro “A Imprensa em Blumenau”.
Arquivo e texto de Carlos Braga Mueller/Jornalista e escrito