terça-feira, 25 de outubro de 2011

- Enchente de 1911

UM SÉCULO DEPOIS
(Histórias da minha avó VI)

Por Urda Alice Klueger /Colunista
Naqueles anos em que eu tinha oito, nove, dez anos, minha avó Emma Katzwinkel Klueger morou na nossa casa, à rua Antônio Zendron 668 – Garcia – Blumenau. Aquela foi a única avó que eu conheci e outras vezes já escrevi sobre ela, uma grande contadora de histórias, um grande achado para uma criança curiosa e ávida de novidades como eu era. Passava horas infindas ouvindo o que ela tinha para contar, e assim acabei aprendendo uma porção de coisas. É claro que naquela época e lugar usar a palavra “avó” ficaria uma coisa muito estranha – avós de origem alemã eram chamadas de Oma (os avôs era Opa) (apesar de a minha avó ser imigrante lituana) – já as avós e avôs de ascendência italiana eram nona e nono.
Pois bem, foi com a minha Oma Klueger que eu muito convivi naquele período em que estava aprendendo a minha própria vida, e agora que é o ano de 2011 e, portanto, já se passou um século desde a grande enchente de 1911, fico a me lembrar das coisas que ela contava a respeito.
Vapor Progresso que prestou relevantes serviços nesta enchente
como também o Vapor Blumenau.
Em 1911 minha Oma já era casada e tinha uma criança, tia Wanda. Tio Erich, seu segundo filho, nasceu durante a enchente, coisa tão marcante que acho que todo o mundo sabia – eu, pelo menos, nunca esqueci tal fato – se vivo, tio Erich Klueger estaria fazendo 100 anos neste mês de outubro.
 Lojas Husadel - Relojoaria
 Com tanta chuva e umidade minha Oma tinha dificuldade de manter secas as fraldas do seu bebezinho e as punha a secar sobre o fogão de lenha. Não podemos esquecer que na casa já havia uma menininha que estava muito enciumada com a chegada daquela concorrência, e que já era esperta o suficiente para tentar fazer valer seus sentimentos: em pleno frio da enchente, pegou o irmãozinho recém nascido, desembrulhou-o e deixou-o abandonado sem as fraldas secadas com tanto trabalho! Coisas inolvidáveis que uma avó pode contar para uma criança!
Mas minha Oma tinha muitas outras coisas para contar sobre aquela enchente.
Confeitaria, pousada, salão de Hermann Hinkeldey
Depois Cine Garcia e por último Igreja Santo Antônio

Blumenau rua XV de Novembro
Foi através dela que eu soube que o rio da cidade represara até a baixada da Rua Antônio Zendron, onde eu morava, chegando aos pés do Salão Hinkeldey , que pertencera a um tio do meu pai, casado com uma das moças Klueger irmãs do meu avô. É claro que desde 1911 as coisas tinham mudado – quando eu era criança, o antigo Salão Hinkeldey se chamava Cine Garcia, onde vi muitos filmes de Tarzan e Elvis Presley – hoje, naquele lugar há a Igreja de Santo Antônio, que pertencera a um tio do meu pai, casado com uma das moças Klueger irmãs do meu avô.

Havia mais curiosidades a aprender sobre aquela enchente, no entanto. Se o rio da cidade viera até ali na baixada da minha rua, tal significava que ele cobrira as terras de muitos moradores que eu conhecia, como as do seu Leo Deschamps. Bem no pasto do seu Leo Deschamps minha avó me mostrava uma pequena depressão no meio da grama onde, quando as águas refluíram, ficaram presas ali muitas traíras, peixe muito conhecido e apreciado lá nos tempos em que eu era criança.
- As pessoas mataram as traíras a facão – contava minha avó, e dava detalhes, sobre como as traíras estavam furiosas, tentando desesperadamente salvar suas vidas aprisionadas naquele pouco de água que o sol estava evaporando, e de como elas esbravejavam e tentavam escapar dos facões e, criança sensível que eu era, morria de pena das pobres traíras e como que via sua luta que fazia a pouca água espumejar e a morte sem piedade de todas elas.
Eu nunca esqueci daquele exato lugar no pasto do seu Leo Deschamps onde houvera aquela matança de traíras em 1911, nem nunca consegui passar lá sem me lembrar.
Recentemente, passei por lá de novo, e a baixada da rua Antônio Zendron já não tem mais nenhum pasto, e fica complicado se lembrar como era lá nos anos da minha infância. Foi-me fácil, no entanto, identificar o lugar onde aquelas traíras lá do passado morreram sob tanta selvageria: naquele lugar, exatamente naquele lugar, hoje, há uma pequena praça de esportes, toda de concreto, próxima da Associação Kolping. Talvez ninguém mais vivo, hoje, se lembre daquilo. Achei que era minha obrigação escrever a respeito.
Blumenau, 15 de outubro de 2011.

Urda Alice Klueger/Escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR
Para saber mais acesse: http://adalbertoday.blogspot.com/2011/10/ano-2011-centenario-da-grande-enchente.html
Arquivo de Adalberto Day/AHJFS - Arquivo Histórico  José Ferreira da Silva
Colaboração José Carlos de Oliveira

4 comentários:

  1. Boa tarde Adalberto.
    Muito interessante esta matéria da querida Urda.
    O avô Hermann "casado com uma das moças Klueger" se vivo fosse deveria saber contar muito desta grande enchente. Infelizmente quando eu nasci, ele já havia falecido e o pai na época tinha apenas 5 meses. Valeu a lembrança, Urda !
    Quanto à matança das traíras em 1911 no lugar próximo a Kolping, não ouvi falar, mas fico perplexo com a forma da matança...
    Abraço

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  2. Caríssimo amigo Beto,
    Gostei muito do artigo seu sobre a Urda Klueger. Ela escreve muito bem. Um estilo franco, livre e bastante sentimental, na medida em que aborda seus familiares e amigos de infância. Tenho uns livros dela Gosto da maneira como ela escreve. Interessante que vocês foram colegas contemporâneos de colégio e, praticamente seguiram quase pelo mesmo rumo. Parabéns meu nobre amigo por mais uma pagina da nossa bela historia, que são sempre muito bem selecionadas pelo amigo, numa narração muito atrativa e muitas vezes pitoresca. Um grande e fraterno abraço.
    Eutraclínio A. Santos

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  3. Amigo Beto assim como todos te chaman,não entendi a idade da Urda por dizer que tinha oito o nove anos, não sei mas tenho a Urda aquela que escreveu um livro sobre Papai Noél , tão jovem e linda como quando me autografou um de seus livros para mim lembro foi la no trevo da rua sete com a rua da faculdade, que vergonha como filho de blumenau não lembro o nome de ruas mas como todos os Blumenauen-se ruas e praças so se conhece por apelido como a pinguela atras do estadio do olimpico,mas igual a éla te digo eu tinha um avó que enquanto eu tinha uma moéda no meu cofrinho igual a um porquinho ele não parava de me contar historias mas cobrava cada uma quando as moédas acabavam eu me punha a chorar e ele muito querido me devolvia todas passando a sua velhas e resistentes mãos na minha cabeça a me consolar, bonita a historia parabens um abraço a todos voces deste seu amigo Valdir

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